Sumário
Introdução. Pressupostos de admissibilidade da tutela jurisdicional. Pressupostos genéricos de admissibilidade recursal. Pressupostos intrínsecos de admissibilidade recursal. Pressupostos extrínsecos de admissibilidade recursal. Recorribilidade ordinária e extraordinária. O prequestionamento. Princípios recursais. Conclusão.
Introdução
Os requisitos ou pressupostos de admissibilidade dos recursos são diferentes dos requisitos de admissibilidade da ação ou da tutela jurisdicional, apesar da analogia que se pode estabelecer entre uns e outros.
Antes de apreciar o conteúdo recursal, deve ser examinado uma série de requisitos, que compõem o chamado juízo de admissibilidade. Daí dizer Araken de Assis[1] que, “quando admissível o recurso, mercê do cumprimento desses requisitos, se diz que ele é conhecido; inadmissível, ele é não conhecido”.
Por sua vez, os princípios recursais são diretrizes fundamentais aplicáveis ao sistema recursal como um todo, sendo adotados pelo sistema jurídico por opção política e ideológica. Diretamente ou indiretamente, decorrem necessariamente de princípios fundamentais do processo ou de princípios constitucionais. O estudo dos princípios recursais complementam a disciplina dos recursos e possibilitam a compreensão do sistema recursal como um todo.
1. Pressupostos de admissibilidade da tutela jurisdicional.
O Código de Processo Civil adotou a doutrina do direito abstrato de ação, donde surge o trinômio processual (pressupostos processuais, condições da ação e mérito da causa).
Para que o juiz possa dar razão a alguma das partes no processo, deve examinar questões preliminares que antecedem lógica e cronologicamente a questão principal: o mérito (pedido). Na lição de Nelson Nery Junior,[2] “estas questões preliminares dizem respeito ao próprio exercício do direito de ação (condições da ação) e à existência e regularidade da relação jurídica processual (pressupostos processuais). As condições da ação possibilitam ou impedem o exame da questão seguinte (de mérito). Presentes todas, o juiz pode analisar o mérito, não sem antes verificar se também se encontram presentes os pressupostos processuais. Ausente uma delas ou mais de uma, ocorre o fenômeno da carência de ação (CPC 301 X), ficando o juiz impedido de examinar o mérito. A carência de ação tem como conseqüência a extinção do processo sem julgamento do mérito (CPC 267 VI). As condições da ação são três: legitimidade das partes, interesse processual e possibilidade jurídica do pedido”.
A relação jurídica processual, para que se torne válida, capaz de produzir efeitos e permitir que as partes alcancem a obtenção de uma sentença de mérito, necessita preencher alguns requisitos. Estes elementos de validade são os denominados pressupostos processuais.
Na verdade, as condições da ação (art. 267, VI, do CPC) e os pressupostos processuais (art. 267, IV, do CPC) constituem requisitos ou pressupostos de admissibilidade para a tutela jurisdicional.
Nos dizeres de Pontes de Miranda, chamam-se pressupostos processuais as qualidades que o juízo, as partes e a matéria submetida, bem como os atos essenciais do início devem apresentar, para que possa ser proferida sentença com entrega da prestação jurisdicional. Tudo, pois, que se pressupõe para que tal sentença seja possível.
A identificação e classificação dos pressupostos processuais são as mais variadas possíveis, tanto na doutrina nacional como na estrangeira, tendo em vista que o Código de Processo Civil não tratou o tema com muita clareza, ficando ao encargo da doutrina esta tarefa.
Porém, o CPC não é de todo omisso. Pelo contrário, preocupou-se o legislador em dispor que extingue-se o feito, sem julgamento do mérito, “quando se verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo” (art. 267, IV, do CPC), sem falar, ainda, no disposto art. 301 do mesmo diploma processual.
Por outro lado, deixou ainda entrever, em vários artigos, quais são os denominados pressupostos processuais antecedentes ou de constituição da relação processual e os requisitos conseqüentes necessários à manutenção do seu desenvolvimento válido e regular.
Para a validade, regularidade e existência da relação processual são indispensáveis certos pressupostos. Então, para que a relação processual se forme e se desenvolva e produza sentença de mérito válida é preciso que estejam presentes certas circunstâncias de fato e de direito chamadas pressupostos processuais.
Segundo Chiovenda, os pressupostos processuais compreendem as condições para a obtenção de um pronunciamento qualquer, favorável ou desfavorável, sobre a demanda. Consoante afirma Liebman, não se trata de pressupostos do processo, mas de pressupostos do processo regular, suscetível de conduzir ao efetivo exercício da função jurisdicional. Assevera o autor: “Subsiste, com efeito, um processo mesmo quando falecem aqueles pressupostos e é no próprio processo que se examina a existência ou inexistência deles”.
A ausência de um pressuposto processual impõe ao juiz que extinga o processo sem julgamento de mérito, o que não importa dizer que inexistiu processo, mas apenas que este se desenvolveu de forma irregular.
Os pressupostos processuais são classificados por Arruda Alvim em pressupostos de existência e de validade do processo, além dos pressupostos processuais negativos. Os pressupostos processuais são requisitos necessários para que a relação jurídica processual se constitua e tenha validade e, assim, a falta de qualquer um deles acarreta a nulidade ex radice do processo e, por isso mesmo, impossibilita a decisão sobre o merecimento do pedido.
O pedido é o pressuposto dos pressupostos, antecedente lógico de qualquer atividade jurisdicional. Acrescente-se que deve ele ser apresentado na forma legal ou, pelo menos, com o mínimo de formalidade indispensável para que seja compreendido, provocando uma decisão judicial a respeito. Sem isso, o processo será abortado in limine.
O Prof. Alfredo Buzaid foi incisivo ao afirmar que pressupostos são todas aquelas circunstâncias que devem existir para tornar o processo admissível. E, com base em Liebman, Chiovenda, Rosenberg e Schonke, denominou estas circunstâncias mencionadas de pressupostos processuais positivos, a fim de distingui-las da categoria dos impedimentos processuais, também chamados de pressupostos processuais negativos, cujo conhecimento depende, via de regra, de provocação da parte. Tal distinção é procedente e oportuna, porque faz demonstrar a necessidade de serem os pressupostos processuais positivos (que são os verdadeiros requisitos da relação processual) conhecidos pelo juiz ex officio, a qualquer tempo; o mesmo não ocorre com os ditos pressupostos processuais negativos.
2. Pressupostos genéricos de admissibilidade recursal
Os requisitos ou pressupostos de admissibilidade recursal podem ser encartados num só grupo, denominados requisitos genéricos de admissibilidade dos recursos. Na verdade, inexiste uniformidade na doutrina processual a respeito do rol dos chamados requisitos de admissibilidade dos recursos.
A doutrina majoritária classifica os requisitos de admissibilidade em intrínsecos (concernentes à própria existência do poder de recorrer) e extrínsecos (relativos ao modo de exercê-lo). Essa classificação, apesar de criticada por Ada Pellegrini Grinover, é a utilizada pela maioria da doutrina, capitaneada por Barbosa Moreira. Em suma, os requisitos de admissibilidade dos recursos podem ser classificados em pressupostos intrínsecos e pressupostos extrínsecos.
Em geral, entende-se que os pressupostos genéricos são: a) intrínsecos (condições recursais): cabimento (possibilidade recursal), interesse recursal e legitimidade para recorrer; b) extrínsecos: preparo, tempestividade e regularidade formal.
Elenca Nelson Luiz Pinto os seguintes requisitos genéricos de admissibilidade dos recursos:[3] cabimento, legitimidade para recorrer, interesse em recorrer, tempestividade, preparo e regularidade formal.
Chama Nelson Luiz Pinto de requisitos genéricos de admissibilidade porque são aplicáveis a toda e qualquer espécie de recurso, sempre. Qualquer que seja a modalidade de recurso interposto, devem esses requisitos ser preenchidos pelo recorrente e observados, conferidos pela autoridade competente para o juízo de admissibilidade, devendo sua não-observância acarretar o não recebimento ou não conhecimento do recurso interposto, conforme o caso.
Tais requisitos – extrínsecos e intrínsecos - são denominados por Ovídio Baptista da Silva[4] como pressupostos genéricos, inspirado na lição de José Frederico Marques, porquanto são exigidos para todos os recursos. Cada um dos quais, por sua vez, ficará ainda submetido a outras exigências especiais de admissibilidade que apenas a eles digam respeito. Deve-se, igualmente, observar que mesmo os requisitos genéricos, às vezes, não são exigidos como condição de admissibilidade para certos recursos, como a desnecessidade de preparo em agravo retido (art. 527, § 1º, do CPC) ou nos embargos de declaração (art. 536, § único, do CPC).
Os pressupostos genéricos podem ser classificados, ainda, em objetivos e subjetivos, como ensina Ovídio Baptista da Silva.[5]
Seriam pressupostos genéricos subjetivos os seguintes: a) capacidade processual do recorrente; b) legitimação, formada por dois elementos: a sucumbência e o interesse; c) a ausência de pressupostos subjetivos negativos, tais como a desistência, a renúncia ao recurso, ou a aceitação tácita da decisão recorrida por aquele que pretenda impugná-la através do recurso. O exame da capacidade processual do recorrente, ou de sua legitimatio ad processum, arrolado como pressuposto subjetivo genérico, é requisito só raramente presente ao juízo de admissibilidade dos recursos. Tratando-se de recurso interposto por terceiro prejudicado (art. 499 do CPC), cuja participação no processo apenas nesse momento se tenha dado, haverá necessidade de averiguar a existência de capacidade processual para estar em juízo e a própria capacidade postulatória do recorrente.
E seriam pressupostos genéricos objetivos: a) existência de previsão legal do recurso; b) adequação; c) tempestividade; d) regularidade formal; e) preparo.
Evidentemente, dependendo da espécie de recurso utilizado pelo recorrente, serão esses requisitos genéricos definidos, explicitados, especificados e adaptados ao recurso escolhido, completando-se seu perfil. Teremos, assim, esses requisitos genéricos especificados para um recurso determinado (pressupostos recursais específicos).
Exemplificando, tomemos um dos requisitos genéricos de admissibilidade: a tempestividade. Todo recurso deve ser tempestivo para ser conhecido, isto é, deve ter sido interposto dentro do prazo legal. Trata-se, evidentemente, de uma formulação genérica. Mas cada julgador, diante de um determinado recurso, examinará sua tempestividade em função do prazo que a lei prevê para esse recurso (requisito específico para aquele recurso).
Portanto, os chamados requisitos genéricos de admissibilidade somente são concretamente aferidos quando delineados pelas regras do recurso em espécie, quando então, especificados, podem ser chamados de requisitos específicos de admissibilidade para esse determinado recurso.
Entretanto, conhecer os requisitos de admissibilidade dos recursos em sua formulação genérica é relevante, porque estes nos fornecem o roteiro a ser seguido tanto pelo recorrente, quando da interposição, como pela autoridade encarregada do exame da admissibilidade de qualquer recurso.
3. Pressupostos intrínsecos de admissibilidade recursal
Em relação ao contexto da admissibilidade, intrínseco é o requisito relativo à existência do poder de recorrer.
Entre os pressupostos intrínsecos (condições recursais), segundo Ovídio Baptista da Silva,[6] que se ampara na lição de Barbosa Moreira, estão:
a) cabimento do recurso, ou seja, a existência, num dado sistema jurídico, de um provimento judicial capaz de ser atacado por meio de recurso; previsão legal;
b) a legitimação do recorrente para interpô-lo (art. 499 do CPC: parte, MP e terceiro interessado);
c) o interesse no recurso (interesse recursal): utilidade e necessidade do recurso;
d) a inexistência de algum fato impeditivo (desistência do recurso ou da ação, reconhecimento jurídico do pedido, transação, renúncia ao direito sobre que se funda a ação ou depósito prévio da multa/deserção) ou extintivo (renúncia ao recurso e aquiescência à decisão) do direito de recorrer.
Por entender tratar-se de categoria perfeitamente subsumível à do interesse em recorrer, Nelson Luiz Pinto[7] prefere excluir do elenco dos pressupostos intrínsecos a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer. Entende o referido jurista que a inexistência de fatos impeditivos ou extintivos estaria encartado na categoria do interesse recursal.
De acordo com a classificação dos requisitos genéricos proposta por Ada Pellegrini Grinover, o cabimento, legitimidade recursal e interesse recursal integrariam a categoria das condições recursais (cabimento= possibilidade recursal, legitimidade e interesse recursal), enquanto que a tempestividade, preparo e regularidade formal integrariam a categoria dos pressupostos recursais (requisitos extrínsecos), ao lado, segundo referida jurista, da investidura do juiz, da capacidade de quem formula o recurso e da inexistência de fatos impeditivos ou extintivos.
Para Nelson Luiz Pinto,[8] este último requisito proposto por Ada Pellegrini Grinover (inexistência de fatos impeditivos ou extintivos) estaria encartado na categoria do interesse recursal. Quanto aos outros dois (investidura do juiz e capacidade de quem formula o recurso), não seriam pressupostos propriamente recursais, mas de pressupostos processuais, que deveriam estar presentes em qualquer ato processual e cuja ausência comprometerá sua validade.
4. Pressupostos extrínsecos de admissibilidade recursal
Constituem requisitos extrínsecos ou pressupostos extrínsecos de um recurso (pressupostos recursais), ligados ao modo de exercer o recurso, de acordo com a melhor doutrina, a tempestividade, a regularidade formal e o preparo.
Se o recurso for interposto além do prazo, ele é inadmissível, porque intempestivo, cujo controle é feito também pelo juízo ad quem. O preparo representa ônus do recorrente de comprovar, no ato da interposição, a realização do preparo (art. 511 do CPC), sob pena de deserção.
Por fim, a regularidade formal decorre da imposição legal da forma rígida ao ato de recorrer, enumerando Araken de Assis quatro requisitos genéricos de regularidade de forma:[9] a) petição escrita; b) identificação das partes; c) motivação; f) pedido de reforma ou de invalidação do pronunciamento recorrido; há ainda outros requisitos específicos, tais como assinatura do advogado, formação do instrumento com peças obrigatórias e legíveis etc. A regularidade procedimental, na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso,[10] incluiria o preparo, a motivação, o pedido de nova decisão e o contraditório.
Pode-se incluir, ainda, no rol dos pressupostos extrínsecos de admissibilidade recursal, o requisito constitucional do prequestionamento (pressuposto específico de recursos extremos), por estar ligado ao modo de exercer o direito de recorrer, muito embora a doutrina seja um pouco omissa a respeito. Contudo, não é por outra razão que Nelson Nery Junior,[11] ao comentar o art. 541 do CPC, entende que, para preencher o requisito da regularidade formal, “o recorrente deve interpor o RE ou o REsp obedecendo os requisitos mencionados na CF e na norma ora analisada. Faltando um dos requisitos estabelecidos na CF e na norma sob comentário, o recurso não poderá ser conhecido”.
5. Recorribilidade ordinária e extraordinária
A doutrina distingue os recursos em ordinários e extraordinários. No entanto, para alguns sistemas europeus (como no direito italiano e português), são ordinários todos os recursos que correspondem a meios de impugnação, na mesma relação processual, capazes de prolongar a pendência da causa, evitando a formação da coisa julgada. Já os recursos extraordinários são os recursos interpostos contra uma sentença já transitada em julgado.
Há, todavia, um outro critério, citado por Ovídio A. Baptista da Silva e Fábio Gomes,[12] de grande importância para a classificação dos recursos, que leva em conta não a circunstância de ter ou não ocorrido a coisa julgada, e sim a natureza ou os pressupostos que se exijam para sua fundamentação. Segundo este critério, os recursos dizem-se de fundamentação livre, ou ilimitada, e de fundamentação vinculada ou limitada; ou, como prefere chamá-los José Frederico Marques, recursos normais e recursos especiais, segundo pressuponham apenas a sucumbência do recorrente ou exijam, além dela, outros pressupostos. Seria o caso da recorribilidade ordinária (de devolutividade ampla).
De acordo com este critério, temos, no direito brasileiro, na apelação, o exemplo típico de recurso de fundamentação livre, pois ela pressupõe apenas a sucumbência, ao passo que os embargos infringentes (art. 530 do CPC) e o recurso extraordinário (art. 102, III, da Constituição Federal) serão recursos de fundamentação vinculada, ou especiais, uma vez que, cada um deles, além da sucumbência, pressupõe outros requisitos de admissibilidade. Estes recursos vinculados ou especiais fariam parte da recorribilidade extraordinária, de via estreita ou excepcional.
Entre os recursos extraordinários (recorribilidade extraordinária) estão o recurso especial, o recurso extraordinário e os embargos de divergência em REsp ou RE. São considerados, em razão do objeto tutelado, recursos de estrito direito ou mesmo excepcionais (estreitos).
Já os recursos ordinários (recorribilidade ordinária) são a apelação, o agravo, os embargos infringentes, os embargos de declaração e o recurso ordinário, sendo o mais característico o recurso de apelação. Visam, em especial a apelação, a correção da injustiça da decisão, sendo amplamente permitida a rediscussão da matéria fática e probatória.
6. O prequestionamento
O prequestionamento é tema de máxima importância à eficácia do sistema processual civil brasileiro, notadamente nas esferas recursais extraordinária e especial. O prequestionamento é tido pela doutrina como requisito constitucional, além de um dos pressupostos recursais.
Na verdade, o termo prequestionamento é, tecnicamente, inadequado. O ideal seria a denominação “pré-decisão”, “pré-pronunciar” ou “pré-julgamento”. Isso significa que deve haver o questionamento dentro do tribunal.
Em síntese apertada, o prequestionamento deve ocorrer no acórdão de última ou única instância, e não nas razões recursais trazidas pela parte. Sem o exame da matéria objeto do especial pelo tribunal a quo, incide o enunciado da Súmula 211 do Superior Tribunal de Justiça (“Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal “a quo”).
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente afirmado ser imprescindível que se tenha como configurado o prequestionamento, ou seja, quando as normas não só hajam sido lançadas a debate no apelo ordinário, mas também tenham sido objeto de deliberação do colegiado. É assente a necessidade do prequestionamento explícito, admitindo-se, em casos excepcionais, o denominado prequestionamento implícito.
Portanto, o prequestionamento, necessidade de o tema objeto do recurso haver sido examinado pela decisão atacada, constitui exigência inafastável da própria previsão constitucional do recurso excepcional. Sem o exame da matéria objeto do especial pelo tribunal a quo, incidem os enunciados das Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. Neste sentido: Ag 406.202-RS, Rel. Min. Castro Filho, 3ª Turma/STJ, DJ de 18.03.2003, p. 444.
7. Princípios recursais
Costuma-se justificar a existência de recursos ao inconformismo humano. Por isso, por princípio, o sistema processual admite o acesso da parte inconformada ao rejulgamento do feito.
O estudo do princípios pertinentes aos recursos revela uma certa contradição. De um lado, verifica-se grau cada vez maior de formalismo a cada nova decisão. De outro lado, e em contrapartida, há uma amplitude cada vez mais acentuada de abordagem no grau de recurso de apelação.
Começa pela enumeração taxativa dos recursos. Depois, temos a singularidade (cabe apenas um recurso para a mesma decisão). Cabe referir, ainda, a irrecorribilidade em separado das interlocutórias e a obrigatoriedade da indicação dos fundamentos de fato e de direito da inconformidade (princípio da dialeticidade). Ainda que se admita a fungibilidade, não se admite erro grosseiro. O rigor na forma culmina com a necessidade da “precisa indicação do dispositivo ou alínea que autoriza” o recurso extraordinário, conforme prevê o art. 321 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (Agravo de Instrumento nº 134.070-3/STF; DJU, 5.4.95, p. 8.385; Rel. Min. Maurício Corrêa).
Seja como for, não parece próxima a solução do debate em torno do que seja melhor para o sistema processual: o risco de decisões irrecorríveis, porém céleres e com maior proximidade entre o julgador e parte; ou o risco de decisões com julgadores distantes (no tempo e no espaço) das partes, mas resguardado o direito natural de inconformidade do prejudicado.
De forma geral, os princípios são regras não-escritas que decorrem ou de outras regras escritas, ou de um conjunto de regras, ou do sistema jurídico como um todo, orientando não apenas a aplicação do direito positivo mas, também, a própria elaboração de outras regras, que a eles devem guardar obediência e hierarquia. Os princípios recursais devem ser analisados em conjunto com normas dos recursos em geral, suprindo e orientando a ausência de regras expressas.
De acordo com Nelson Nery Junior,[13] os princípios fundamentais dos recursos civis são: a) princípio do duplo grau de jurisdição; b) princípio da taxatividade; c) princípio da singularidade; d) princípio da fungibilidade; e) princípio da dialeticidade; f) princípio da voluntariedade; g) princípio da irrecorribilidade em separado das interlocutórias; h) princípio da complementaridade; i) princípio da proibição da reformatio in pejus (non reformatio in pejus); j) princípio da consumação.
Além do princípio da recursividade (tratado como princípio ligado à jurisdição) e do princípio da voluntariedade (tratado como princípio ligado ao princípio do duplo grau de jurisdição), Rui Portanova enumera os seguintes princípios ligados aos recursos[14], baseado em Nelson Nery Junior (Princípios fundamentais – Teoria geral dos recursos): a) princípio do duplo grau de jurisdição (princípio do duplo grau de jurisdição voluntário; princípio do duplo grau de jurisdição mínimo; princípio do controle hierárquico); b) princípio do duplo grau de jurisdição obrigatório (princípio da remessa oficial; princípio da remessa ex officio; princípio do reexame necessário); c) princípio da taxatividade; d) princípio da singularidade (princípio da unirrecorribilidade; princípio da unicidade); e) princípio da fungibilidade (princípio do recurso indiferente; princípio da permutabilidade dos recursos; princípio da conversibilidade dos recursos); f) princípio da dialeticidade; g) princípio da devolutividade dos recursos (princípio da devolutividade plena; princípio da devolutividade plena dos recursos, tantum devolutum quantum appellatum; princípio da proibição da reformatio in pejus (non reformatio in pejus); princípio do efeito devolutivo; princípio de defesa da coisa julgada parcial); h) princípio da irrecorribilidade em separado das interlocutórias.
Já Nélson Luiz Pinto enumera os seguintes princípios recursais, ligados ao processo civil:[15] a) princípio do duplo grau de jurisdição e Estado de Direito; b) princípio da taxatividade; c) princípio da singularidade; d) princípio da fungibilidade; e) princípio da voluntariedade; f) princípio da proibição da “reformatio in pejus” (non reformatio in pejus).
Outros princípios recursais elencados por Arruda Alvim são: princípio das decisões juridicamente relevantes; princípio da legalidade; princípio da tipificação; princípio do ônus de recorrer; princípio do efeito suspensivo; princípio do benefício comum; princípio da dupla conformidade e, ainda, o que chama de princípios racionais de um sistema recursal.
Por sua vez, Ada Pellegrini Grinover enumera os seguintes princípios gerais dos recursos:[16] a) princípio da taxatividade dos recursos; b) princípio da unirrecorribilidade das decisões; c) princípio da variabilidade dos recursos e preclusão consumativa; d) princípio da complementaridade dos recursos; e) princípio da fungibilidade dos recursos; f) princípio da dialeticidade dos recursos; g) princípio da disponibilidade dos recursos; h) princípio da personalidade dos recursos; i) princípio da personalidade dos recursos e proibição da reformatio in pejus (non reformatio in pejus); j) princípio da nulidade da sentença e proibição da denominada reformatio in pejus indireta.
Em resumo, estes são os princípios recursais mencionados pela doutrina.
Conclusão
A análise dos requisitos de admissibilidade recursal demonstra a complexidade e formalidade atinente ao ato de recorrer, especialmente em sede de via estreita ou excepcional. Impera, portanto, a técnica recursal (tecnicismo).
O fundamento para as inúmeras exigências processuais decorrem da forma excepcional do recurso, onde o órgão jurisdicional já prestou a tutela pleiteada, ainda que contrária aos interesses das partes. O acúmulo de recursos nos tribunais ampliam o rigor formal, às vezes até em prejuízo do princípio da instrumentalidade do processo.
Assim, embora seja o recurso um meio de restauração do justo e recomposição da justiça, as inúmeras exigências procedimentais fazem com que haja a prevalência da forma em detrimento da questão meritória (de fundo).
Contudo, o Direito está cada vez mais principiológico do que normativo. Há uma visível transição do Direito normativista para o Direito principiológico. Daí a importância dos princípios como instrumento para superar a rigidez normativa e alcançar a razão e a justiça. A mudança de paradigma teve muita contribuição de Ronald Dworkin e Robert Alexy.
A ordem jurídica passou a ser encarada como um sistema aberto de princípios e regras, suscetíveis a valores jurídicos suprapositivos, na qual a idéia de justiça desempenha papel fundamental, inclusive no processo (processo justo).
Bibliografia
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GRINOVER, Ada Pellegrini. O processo em evolução. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1996.
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
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PINTO, Nelson Luiz. Manual dos recursos cíveis. São Paulo: Malheiros Editores, 2001.
PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.
SILVA, Ovídio A. Baptista da, GOMES, Fábio. Teoria geral de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. vol. 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
[1] ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 293.
[2] NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 593.
[3] PINTO, Nelson Luiz. Manual dos recursos cíveis. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 59.
[4] SILVA, Ovídio A. Baptista da, GOMES, Fábio. Teoria geral de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 315.
[5] SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. vol. 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 418.
[6] SILVA, Ovídio A. Baptista da, GOMES, Fábio. Teoria geral de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 315.
[7] PINTO, Nelson Luiz. Manual dos recursos cíveis. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 58.
[8] PINTO, Nelson Luiz. Manual dos recursos cíveis. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 59.
[9] ASSIS, Araken de. Doutrina e prática do processo civil contemporâneo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 326.
[10] MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 123.
[11] NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 911.
[12] SILVA, Ovídio A. Baptista da, GOMES, Fábio. Teoria geral de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 310.
[13] NERY JUNIOR, Nelson. Princípios fundamentais – Teoria geral dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 34.
[14] PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999, p. 263.
[15] PINTO, Nelson Luiz. Manual dos recursos cíveis. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 79.
[16] GRINOVER, Ada Pellegrini. O processo em evolução. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1996, p. 70.
Mestre em Direito/UFPE. Advogado e Professor em Brasília-DF
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PARIZ, Ângelo Aurélio Gonçalves. Pressupostos de admissibilidade recursal e princípios recursais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 maio 2009, 09:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/17465/pressupostos-de-admissibilidade-recursal-e-principios-recursais. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Por: PRISCILA GOULART GARRASTAZU XAVIER
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