A nova Lei do Mandado de Segurança – Lei Federal n° 12.016, de 07 de agosto de 2009 – mal teve sua gênese e já causou debates inúmeros debates entre na seara dos operadores do direito: a faculdade do Magistrado vincular a suspensão do ato à pretação de caução inidônea.
Dicciona o texto legal em apreço:
Art. 7o Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:
II - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica.[1]
O tema é deveras polêmico. Referida norma – facultando ao Magistrado a exigência de caução para a concessão de medida liminar em Mandado de Segurança – sofreu duras críticas de diversos segmentos da esfera jurídica (OAB, Magistrados, etc.).
Apesar de sua breve existência, a dissonância doutrinária acerca deste comando legal é latente. Alguns advogam pela sua possibilidade e eficácia, muito embora outros proferem duras críticas à ela, mormente por fulminar princípios mais comezinhos do da ordem jurídica nacional.
Antes de quaisquer considerações, insta expender argumentos propedêuticos. O Mandado de Segurança sempre constitui-se em medida eficaz para coibir ofensa a direitos líquidos e certos, sobre os quais não demandem dilação probatória. Trata-se de medida processual de cognição sumária, justificada pela afronta a garantia estampado nas ordens constitucional e infraconstitucional.
As medidas processuais de cognição sumária passaram a se tornar rotina nos meandros das ações judiciais. Isto nada mais é do que uma resposta do Poder Judiciário à maior expectativa da população para com o Poder Judiciário: a efetividade do processo, num transcurso de tempo razoável.
Foi nesse pensar que o legislador pátrio alocou o diversas medidas de cognição sumária no rol de Direitos e Garantias fundamentais – dentre elas o Mandado de Segurança.
Diante da especificidade daquelas medidas judiciais de cognição sumária, bem como da ineficiência dos procedimentos de cognição ordinária, em inúmeros casos, sobrevieram as doutrinariamente chamadas medidas de urgência, em suas espécies Tutela antecipada e medida cautelar. Não bastando tal inovação, há permissivo legal para conceder medidas de urgência sem ouvir a outra parte, isto é, compelir outrem a mudar de mente – e de conduta – sem possibilitar a ampla defesa e contraditório. Arrola-se o texto legal pertinente:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação;[2]
Obviamente, a cognição sumária em medida de urgência somente produz os efeitos desejados por aquele que a requer quando respeitados os requisitos legais ensejadores; tudo, sob o manto dos princípios da legalidade e segurança jurídica.
Pois bem. O quesito proposto toca em todos os pontos acima explanados. Num primeiro momento, o pano de fundo da pergunta refere-se ao Mandado de Segurança, o qual, como dito alhures, é instrumento processual-constitucional hábil a resguardar direito líquido e certo não amparável por outras medidas constitucionais.
Por outro lado, as medidas de urgência, em matéria de mandado de segurança, justificam sobremaneira o manejo do referido instrumento contido na carta republicana. Isto porque, além de se restar clarividente a ofensa e direito líquido e certo tutelado tão somente via mandamus,
Ora, o mandado de segurança é, por si só, medida de extrema urgência para afastar do mundo jurídico qualquer ofensa à direito consagrado pela ordem vigente. Este entendimento evidencia-se ainda mais pela possibilidade de concessão de uma tutela de urgência nesse espeque.
Diante de tais considerações, é cediço que qualquer limitação legal ao mandado de segurança, bem como às tutelas de urgência afetas à sua função constitucional, calhará por afastar do Poder Judiciário uma flagrantes lesões a direitos e garantias amplamente propagadas, proliferando, ainda, outras insondáveis afrontas à mesma ordem jurígena, a qual deve ser o prumo direcionador do Poder Judicante.
De outra banda, alguns advogam que não é por mero devaneio dos legisladores que tal norma foi esboçada por diversos juristas auxiliares na edição da referida norma. Ao que tudo indica, ela emana de diversos casos práticos nos quais se evidenciaram lesões irreparáveis àqueles que se submeteram ao cumprimento de tutela urgente e, provavelmente, foram sucumbentes em litígios peculiares.
Defendem também que não podemos negligenciar a infalibilidade das alegações das partes e dos Magistrados, eis que os erros, apesar de não serem um costume perpetrado pelos mesmos, eventualmente os acometem.
Afigura-se, nesse prisma, o realce esposado pelo texto legal em debate: a faculdade atribuída ao Juiz para fixar conceder a medida de urgência mediante a prestação de caução inidônea.
Ainda sob esse enfoque, não merecem guarida tais apontamentos. Qualquer medida de urgência somente será concedida em condições praticamente irrefutáveis, pois, num primeiro momento, a lesão a direito líquido deve explicitar o perigo de se aguardar uma decisão em cognição sumária (periculum in mora), para dar vazão à concessão da medida de urgência em Mandado de Segurança.
O que resta aos operadores do direito é aguardar os efeitos da faculdade legal perpetrada pela Nova Lei do Mandado de Segurança, mesmo porque ainda cabe ao Poder Judiciário analisar a pertinência e cabimento da referida norma.
Por tais razões, a temerária faculdade legal de exigência de caução não merece outro fim, senão a sua fulminação da ordem jurídica pátria, ante a sua incompatibilidade com a função constitucional do Mandado de Segurança aliada à função processual das medidas de urgência.
Apesar de todos esses apontamentos, inclina-se por reconhecer que não haverá malferimento ao direito de ação, uma vez que ao cidadão assiste-lhe, ainda, a possibilidade de aguardar a cognição sumária aplicável ao mandado de segurança, muito embora o mesmo possa ser ineficiente em razão da vinculação da medida de urgência à prestação de caução equivalente.
Pelo exposto, a malfadada exigência legal, apesar de não fulminar o direito de ação, poderá tornar ineficiente o remédio constitucional alhures mencionado, tornando inócua a sua previsão constitucional.
Bibliografia
BRASIL. Lei 12.016, de 07 de agosto de 2009. Disciplina o mandado de segurança individual e dá outras providências.
BRASIL. Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil.
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