1- INTRODUÇÃO
O presente artigo visa abordar as principais vantagens da utilização do interrogatório por videoconferência no sistema pátrio, apesar do tema ser polêmico, o mesmo foi regulamentado pela Lei nº 11.900/09, norma de caráter nacional que trata da sua aplicação apenas em hipóteses excepcionais com fundamento na segurança pública, viabilização do ato processual, risco a instrução criminal e gravíssima questão de ordem pública.
Não obstante as críticas de diversos doutrinadores e da jurisprudência a respeito do tema, com a reforma processual penal, a discussão quanto a possibilidade de realização do interrogatório por videoconferência já se encontra pacificada.
2- VANTAGENS DO INTERROGATÓRIO POR VIDEOCONFERÊNCIA
Uma das principais vantagens seria a redução de gastos por parte do Estado uma vez que a escolta de presos para realização de audiência em Juízo gera elevados custos e onera injustificadamente os cofres públicos, além disso reduz o risco de fuga do réu preso.
Ademais, a realização do interrogatório “on-line” permite uma maior celeridade na tramitação dos processos, pois como tudo é gravado, não há necessidade de se ditar o depoimento, otimizando o tempo dos profissionais da área jurídica, somando-se ao fato que se evita o adiamento de audiência pela não apresentação do acusado, impondo-se a remarcação da mesma.
Muitos autores criticam tal forma de interrogatório, pois, perde-se o imprescindível contato físico entre réu e juiz. Dentre eles, destacamos, René Ariel Dotti que afirma: “a tecnologia não poderá substituir o cérebro pelo computador e muito menos o pensamento pela digitação. É necessário usar a reflexão como contraponto da massificação. É preciso ler nos lábios as palavras que estão sendo ditas; ver a alma do acusado através de seus olhos; descobrir a face humana que se escondera por trás da máscara do delinqüente. É preciso, enfim, a aproximação física entre o Senhor da Justiça e o homem do crime, num gesto de alegoria que imita o toque dos dedos; o afresco pintado pelo gênio de Michelangelo da Capela Sistina e representativo da criação de Adão”.
Ora, o interrogatório por videoconferência não prejudica a percepção dos fatos, pois a utilização de referida tecnologia permite a identificação de como o acusado se comporta quando lhe são feitas as peguntas sobre o fato criminoso que lhe é imputado, de maneira que o juiz poderá ter as mesmas impressões como se estivesse na sala de audiência, preservando-se o princípio da imediação do juiz com as partes.
Nesse sentido, vale destacar a manifestação da Ministra Ellen Grace no HC 90.900/SP: “Além de não haver diminuição da possibilidade de se verificarem as características relativas à personalidade, condição sócio-econômica, estado psíquico do acusado, entre outros, por meio de videoconferência, é certo que há muito a jurisprudência admite o interrogatório por carta precatória, rogatória ou de ordem, o que reflete a idéia de ausência de obrigatoriedade do contato físico direto entre o juiz da causa e o acusado, para a realização do interrogatório.”
Não há que se falar em violação do devido processo legal, pois tal instrumento tecnológico garante ainda mais o acesso ao juiz natural porque todo o processo é conduzido pelo juiz da causa, sem necessidade de qualquer deslocamento espacial, além disso, como tudo é gravado em DVD favorece o alcance da verdade real pois segundo Vladimir Aras o fenômeno sensorial vivenciado pelo juiz da instrução poderá ser compartilhado pelos juízes da apelação.
Ao lado disso, segundo o artigo 399, § 2º, do Código de Processo Penal, o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença, portanto o interrogatório por videoconferência reforça ainda mais o princípio da identidade física do juiz.
Vladimir Aras ainda acrescenta informando que o sistema de videoconferência: “evita prejuízos para a acusação e a defesa, no processo penal, nas coletas de depoimentos por precatória, quando os atos são acompanhados por membros do Ministério Público estranhos à causa e por defensores ad hoc, que pouco sabem sobre detalhes do feito e sobre as estratégias e teses do caso concreto.”
Dessa forma, a realização de atos processuais mediante videoconferência não ofende o princípio do contraditório e nem o da ampla defesa pois as partes são intimadas com dez dias de antecedência, o preso poderá acompanhar todos os atos da audiência una de instrução e julgamento. Outrossim, além de ser assegurado ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor; fica também garantido o acesso a canais telefônicos, reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e o advogado presente na sala de audiência do fórum, e entre este e o preso.
É importante colacionar o seguinte julgados:
“Processual penal. Habeas Corpus. Nulidade. Interrogatório. Videoconferência. Devido processo legal. Prejuízo não demonstrado. O interrogatório realizado por videoconferência, em tempo real, não viola o princípio do devido processo legal e seus consecutários. Para que seja declarada nulidade do ato, mister a demonstração do prejuízo nos termos do art. 563 do código de Processo Penal. Ordem denegada. (HC 34020/SP, Rel. Min. Paulo Medina, 6ª Turma, j. 15.09.2005)”.
“HABEAS CORPUS. ROUBO TENTADO. INTERROGATÓRIO POR VIDEOCONFERÊNCIA. NULIDADE. NÃO-OCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA. 1. A estipulação do sistema de videoconferência para interrogatório do réu não ofende as garantias constitucionais do réu, o qual, na hipótese, conta com o auxílio de dois defensores, um na sala de audiência e outro no presídio. 2. A declaração de nulidade, na presente hipótese, depende da demonstração do efetivo prejuízo, o qual não restou evidenciado. 3. Ordem denegada. (HC 76.046/SP, Rel. Ministro Arnaldo esteves Lima, Quinta Turma, j. 10.05.2007)”.
“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. USO DE DOCUMENTO FALSO. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR, RECEPTAÇÃO. INTERROGATÓRIO DO ACUSADO REALIZADO POR VIDEOCONFERÊNCIA, ANTERIORMENTE À EDIÇÃO DA LEI 11.900/09. NULIDADE ABSOLUTA. ENTENDIMENTO QUE NÃO SE ESTENDE À OUVIDA DAS TESTEMUNHAS. PRECEDENTES DO STJ E STF. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. PARECER DO MPF PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO PROVIDO PARA ANULAR TÃO-SÓ E APENAS O ATO DE INTERROGATÓRIO DO RECORRENTE. 1. É firme é o entendimento desta Corte e do STF quanto à inadmissibilidade do interrogatório virtual, anteriormente à edição da Lei 11.900/09, tal como se dá na espécie. Precedentes. 2. Tal orientação, contudo, não se aplica a audiência em que realizada a instrução, com a ouvida das testemunhas, pois, na linha da jurisprudência desta Corte, a ausência do réu, nesta ato, não configura nulidade se a ele tiver comparecido e não lhe tenha sobrevindo qualquer prejuízo. Precedentes. 3. Ressalva do ponto de vista deste relator que entende pela regularidade do ato judicial realizado por videoconferência; primeiro, porque houve a concordância do defensor; segundo, porque não se constata nenhum sacrifício à defesa do paciente, especialmente quando se seguiram as fases posteriores da instrução, sem que tivesse sido alegado um único prejuízo sequer. Ao meu sentir, regredir-se a uma fase inicial do processo quando não há, às escâncaras, pelo menos, uma mágoa insuperável ao direito de ampla defesa, é incompatível com o princípio pas de nullité sans grief que orienta o processo penal brasileiro. 4. Recurso provido para anular tão-só e apenas o ato de interrogatório do recorrente.(RHC 22971/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Quinta Turma, j. 02.08.2010)”.
Desta feita, é oportuno destacar o entendimento de Pedro Lenza: “Resta aguardar como o STF se posicionará sobre a matéria, que em nosso entender, mostra-se bastante adequada e dentro da realidade da sociedade moderna, sendo, ainda, a nova sistemática prevista como exceção à regra geral que assegura o direito de audiência e de presença (participação).”
3- CONCLUSÃO
É válido ressaltar que apesar das vantagens do interrogatório por videoconferência, este somente será aplicado, excepcionalmente, de ofício pelo juiz ou por provocação das partes, em decisão devidamente fundamentada, nas hipóteses taxativamente previstas em lei.
Assim, consoante artigo 185, §2º, incisos I, II, III e IV, do Código de Processo Penal: “Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessária para atender a uma das seguintes finalidades: I- prevenir risco à segurança, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento; II- viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal; III- impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código; IV- responder à gravíssima questão de ordem pública.”
Com efeito, Vladimir Aras ao abordar o tema em apreço conclui: “Enfim, é hora de olhar para frente e não repetir erros do passado. Registra a crônica forense a polêmica que se deu nos anos 1920, quando começaram a ser adquiridas as primeiras máquinas datilográficas para uso judicial no Brasil. Conta-se que alguns juristas de então eram contrários a esses singelos aparelhos de escrever , que hoje caíram em desuso. Os doutores da época, ciosos de princípios jurídicos só por eles vislumbrados, alertavam para o risco da redação de sentença com máquinas deste tipo, porque alegavam, com elas não havia segurança da autoria dos atos judiciais. Felizmente, ninguém deu ouvidos a esses senhores da lei e hoje, já podemos assinar digitalmente documentos, fazer petições eletrônicas e usa computadores...”.
Portanto, fez bem o legislador em regulamentar esta nova tecnologia uma vez que garante a celeridade da tramitação do processo, assegura o contraditório e ampla defesa, evita a fuga de presos e gastos excessivos com transporte do interrogado até o fórum, dentre outros aspectos favoráveis descritos anteriormente, dirimindo de uma vez, a discussão sobre a legalidade da realização do interrogatório virtual.
5- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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ARAÚJO, Fábio Roque; TÁVORA, Nestor. CPP para Concursos, Salvador, Jus Podivm, 2010.
CALDEIRA, Felipe. Processo Penal: Informativos do STF e STJ Comentados e Sistematizados, Salvador, Jus Podivm, 2010.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal, 16ª edição, São Paulo, Saraiva, 2009.
DOTTI, René Ariel Dotti. O Interrogatório por Videoconferência e as Garantias Constitucionais do Réu. Leituras Complementares de processo Penal, Jus Podivm, Salvador, 2008.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, 14ª edição, São Paulo, Saraiva, 2010.
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OLIVEIRA, Pacelli Oliveira de. Curso de Processo Penal, 13ª edição, Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2010.
PINTO, Batista Ronaldo. Interrogatório On-line ou Virtual – Constitucionalidade do Ato e Vantagens em sua Aplicação. Leituras Complementares de Processo Penal, Jus Podivm, Salvador, 2008.
Técnico do Ministério Público do Estado de Sergipe. Bacharel em Direito, Formado Pela Universidade Tiradentes- UNIT.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GOIS, Max Fernandes. Interrogatório por videoconferência e suas vantagens Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 out 2010, 08:14. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/22010/interrogatorio-por-videoconferencia-e-suas-vantagens. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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