RESUMO: O presente artigo aborda os dispositivos legais existentes que atribuem à Caixa Econômica Federal (CEF) a avaliação prévia de imóveis integrantes do Fundo do Regime Geral da Previdência Social e a possibilidade jurídica de ser contratada diretamente, sob a modalidade de inexigibilidade de licitação.
PALAVRAS-CHAVE: Seguridade Social; Previdência Social; Patrimônio imobiliário do Fundo do Regime Geral da Previdência Social (FRGPS); Art. 68 da Lei Complementar n.º 101/2000.
A gestão do patrimônio imobiliário do Fundo do Regime Geral da Previdência Social (FRGPS) pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deve guardar sintonia com os fins da Previdência Social, assegurando que as receitas obtidas a partir da alienação dos imóveis dominicais do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sejam destinadas ao pagamento dos benefícios previdenciários, na forma do art. 250 da Constituição Federal[1].
Tais bens, no entanto, apesar de estarem desvinculados das atividades operacionais do INSS, permanecem afetados à finalidade constitucional para compor o FRGPS, nos termos do art. 68 da Lei Complementar n.º 101/2000:
Art. 68. Na forma do art. 250 da Constituição, é criado o Fundo do Regime Geral de Previdência Social, vinculado ao Ministério da Previdência e Assistência Social, com a finalidade de prover recursos para o pagamento dos benefícios do regime geral da previdência social.
§ 1o O Fundo será constituído de:
I - bens móveis e imóveis, valores e rendas do Instituto Nacional do Seguro Social não utilizados na operacionalização deste;
II - bens e direitos que, a qualquer título, lhe sejam adjudicados ou que lhe vierem a ser vinculados por força de lei;
III - receita das contribuições sociais para a seguridade social, previstas na alínea a do inciso I e no inciso II do art. 195 da Constituição;
IV - produto da liquidação de bens e ativos de pessoa física ou jurídica em débito com a Previdência Social;
V - resultado da aplicação financeira de seus ativos;
VI - recursos provenientes do orçamento da União.
§ 2o O Fundo será gerido pelo Instituto Nacional do Seguro Social, na forma da lei.
Antes mesmo da referida Lei Complementar, o artigo 61 da Lei n.º 8.212/1991 (Lei de Custeio da Seguridade Social) previu a alienação desses imóveis como maneira de garantir os benefícios do Regime Geral da Previdência Social, ao estabelecer:
Art. 61. As receitas provenientes da cobrança de débitos dos Estados e Municípios e da alienação, arrendamento ou locação de bens móveis ou imóveis pertencentes ao patrimônio do Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, deverão constituir reserva técnica, de longo prazo, que garantirá o seguro social estabelecido no Plano de Benefícios da Previdência Social.
Ao dispor sobre a alienação dos bens imóveis dominicais, o que a Lei nº 9.702/1998 enquadrou como aqueles considerados desnecessários ou não vinculados às suas atividades operacionais, conferiu ao gestor público o dever de aliená-los.
Isto é, a respeito dos bens imóveis dominicais do INSS, não há alternativa a não ser a decisão pela sua alienação, possibilitando o acréscimo das receitas e a melhor manutenção do FRGPS.
A alienação desses bens requer a existência de interesse público, avaliação prévia, autorização legislativa e licitação, nos termos do artigo 17, inciso I, da Lei n.º 8.666/93[2]:
Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:
I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos:
[...]
A alienação desse acervo patrimonial disponível da entidade previdenciária deve ser pautada também pelos procedimentos disciplinados nas Leis ns.º 8.057/1990, 9.702/1998 e 11.481/2007, quais sejam:
Autorização legislativa: a Lei n.º 9.702/1998 permitiu a alienação dos imóveis dominicais mediante a aprovação da autoridade competente, que, no caso do INSS, ocorrerá por meio de decisão do seu Presidente, juntamente com o seu Diretor de Orçamento, Finanças e Logística, nos termos do art. 26, inciso XII, alínea “b” do Regimento Interno do INSS[3], aprovado como anexo do Decreto n.º 7.556/2011.
Existência de interesse público: há necessidade de o gestor, considerando a destinação empregada no imóvel, demonstrar que a decisão pela sua alienação atinge melhor os fins da Previdência Social.
Avaliação prévia: o art. 14, inciso I, da Lei n.º 11.481/2007 dispõe que o preço mínimo inicial terá como base o valor de mercado estabelecido em laudo de avaliação elaborado pelo próprio INSS ou por meio de contratação de serviços especializados de terceiros, cuja validade será de 12 (doze) meses[4].
Leilão público: o artigo 14, caput, da Lei n.º 11.481/2007 disciplina a modalidade de licitação para alienação, por meio de leiloeiro oficial contratado ou por servidor designado.
Oferta pública: o §1º do art. 14 da Lei n.º 11.481/2007 prevê a oferta de venda do imóvel à Administração Pública antes da realização do leilão público, o qual poderá será alienado diretamente, nos termos do art. 15 da Lei n.º 11.481/2007 c/c art. 17, caput, inciso I, alínea “e”, da Lei n.º 8.666/1993[5].
Dentre os requisitos elencados acima, destaca-se para o presente estudo a avaliação prévia a ser realizada pela CEF nos procedimentos de alienação adotados pelo INSS.
A Lei n.º 8.025/90 e Decreto n.º 99.664/1990 vinculam a empresa pública CEF como condutora do procedimento de avaliação para fixar o valor de mercado dos imóveis colocados à venda pelo Instituto, tendo em vista o grau de qualidade e confiabilidade que a CEF mantém em razão de sua expertise no mercado imobiliário[6].
Esse reconhecimento legal de preferência e até imposição na contratação da CEF, pois, se justifica pelo fato de ser a única entidade oficial a realizar avaliação de imóveis, com capilaridade em todo o território nacional, conforme se extrai também dos seguintes acórdãos do Tribunal de Contas da União:
Acórdão 1264/2004 - Plenário
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Relatório de Levantamento de Auditoria, realizado nas obras de construção do Hospital Regional de Cacoal/RO (Programa de Trabalho 10846121408080446), com o objetivo de prestar informações ao Congresso Nacional para subsidiar os trabalhos da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização,
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator, em:
[...]
9.3. requisitar os serviços da Caixa Econômica Federal com vistas a estimar eventual superfaturamento nas obras do Hospital Regional de Cacoal, considerando-se os elementos da obra realizados, os valores vigentes à época dos pagamentos e aqueles efetivamente pagos e as falhas no processo construtivo que tenham resultado em despesas desnecessárias, tanto em relação à Construtora Mendes Carlos Ltda. quanto em relação à Pilar Engenharia Ltda.;
Acórdão 351/2000 - Segunda Câmara
[...]
A Lei n.º 8.666/93 não estabelece qual instituição deve realizar a avaliação prévia, mas nos parece que pode ser considerada no mínimo uma atitude pouco prudente da diretoria da empresa solicitar a avaliação a uma instituição privada, no caso a CVI-GO, quando a Caixa Econômica Federal, entidade oficial e de tradição na realização desse tipo de serviço, poderia perfeitamente ser requisitada para efetuar essa avaliação.
[...]
Voto do Ministro Relator
[...] 2) como bem registrou o douto Parquet, a solicitação de laudo de avaliação junto a uma entidade privada contrariou recomendação do Conselho de Administração da própria empresa, que propunha a utilização, nesses casos, dos serviços de órgãos oficiais, a exemplo da Caixa Econômica Federal, empresa também aliada à esfera federal e detentora de notória idoneidade para emitir laudos da espécie;
Percebe, portanto, que o legislador ordinário afastou a possibilidade de licitação para execução dos procedimentos que envolvem a alienação de imóveis do FRGPS geridos pelo INSS, dentre os quais se inclui a avaliação prévia, ao imputar a CEF uma gama de atribuições incompatíveis com a escolha de outra empresa, por certame licitatório.
Nesse sentido, Lucas Rocha Furtado[7], ao escrever sobre a inviabilidade de competição e inexigibilidade de licitação, afirma que:
Sabe-se que a competição é um dos fundamentos básicos da licitação. Realiza-se esta a fim de que se possa obter a proposta que, nos termos da lei, seja considerada mais vantajosa para a Administração. A licitação não pode ser realizada quando não houver competitividade em relação ao objeto que esteja sendo licitado. A principal característica da inexigibilidade de licitação é, portanto, a inviabilidade de competição, conforme dispõe o art. 25 da Lei de Licitações.
Ou seja, por exigência legal, não há possibilidade de que os serviços de avaliação de imóveis integrantes do FRGPS sejam executados por outros profissionais não integrantes da CEF, o que, por si, afasta a prévia realização do certame licitatório para efetivar a contratação, por inviabilidade de competição, sob a modalidade de inexigibilidade de licitação com base no art. 25, caput, da Lei 8.666/93.
REFERÊNCIAS
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 14. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1996.
[1] Art. 250. Com o objetivo de assegurar recursos para o pagamento dos benefícios concedidos pelo regime geral de previdência social, em adição aos recursos de sua arrecadação, a União poderá constituir fundo integrado por bens, direitos e ativos de qualquer natureza, mediante lei que disporá sobre a natureza e administração desse fundo. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
[2] FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007.
[3] Art. 26. Ao Presidente do INSS incumbe:
[...]
XII - decidir sobre:
[...]
b) alienação e aquisição de bens imóveis, em conjunto com o Diretor de Orçamento, Finanças e Logística;
[...]
[4] Atualmente há contrato celebrado entre INSS e Caixa Econômica Federal, por inexigibilidade de licitação, sobre a prestação de serviços de elaboração de laudo de avaliação.
[5] Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:
I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos:
[...]
e) venda a outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo; (Incluída pela Lei nº 8.883, de 1994)
[...]
[6] Lei n.º 8.025/1990:
[...]
Art. 2º A Caixa Econômica Federal presidirá o processo de licitação na forma do art. 1º desta lei e observará os seguintes critérios:
I - o preço do imóvel a ser alienado será o de mercado, segundo os métodos de avaliação usualmente utilizados pela própria Caixa Econômica Federal;
[...]
Art. 13. As empresas públicas, sociedades de economia mista, respectivas subsidiárias e entidades controladas direta ou indiretamente pela União, ficam autorizadas a proceder aos atos legais e administrativos necessários à alienação de suas unidades residenciais não vinculadas às suas atividades operacionais, com base nos termos desta lei.
Decreto n.º 99.664/1990:
[...]
Art. 2º A CEF será responsável pela avaliação e venda, mediante licitação, ou diretamente aos titulares do direito de preferência, e representará as entidades da Administração Pública Federal indireta, mediante mandato, na celebração e administração dos contratos de compra e venda, promovendo, inclusive, as medidas judiciais que se tornarem necessárias à sua execução.
Lei nº 11.481/07:
[...]
Art. 14. A alienação de bens imóveis do Fundo do Regime Geral de Previdência Social desnecessários ou não vinculados às suas atividades operacionais será feita mediante leilão público, observado o disposto nos §§ 1o e 2o deste artigo e as seguintes condições:
I - o preço mínimo inicial de venda será fixado com base no valor de mercado do imóvel estabelecido em avaliação elaborada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ou por meio da contratação de serviços especializados de terceiros, cuja validade será de 12 (doze) meses, observadas as normas aplicáveis da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT;
[7] FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 441.
Procurador Federal. Mestre em Direito Internacional pela Universidade Católica de Brasília. Chefe de Licitações, Contratos Administrativos e Matéria de Pessoal da Procuradoria Federal junto à Agência Nacional de Transportes Aquaviários em Brasília/DF. Ex-Chefe da Seção de Consultoria e Assessoramento da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS em São Luís/MA. Ex-Chefe da Divisão de Patrimônio Imobiliário da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS em Brasília/DF.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TARCíSIO GUEDES BASíLIO, . A avaliação dos imóveis do Fundo do Regime Geral da Previdência Social pela Caixa Econômica Federal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 nov 2013, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37404/a-avaliacao-dos-imoveis-do-fundo-do-regime-geral-da-previdencia-social-pela-caixa-economica-federal. Acesso em: 22 nov 2024.
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