Ementa: Direito administrativo. Formação do patrimônio público. Alienação. Doação. Art. 17, II, a da Lei nº 8.666/93. Ato de gestão.
Palavras-chave: Patrimônio público. Alienação. Leilão. Doação. Ato de gestão.
A formação do patrimônio público passa por uma série de formalidades legais, uma vez que é preciso ter todo cuidado com as coisas adquiridas com recursos do contribuinte.
No entanto, o passar dos anos torna alguns bens adquiridos pela Administração obsoletos ou antieconômicos, desaparecendo o interesse que tinha sobre eles. Nasce, assim, a possibilidade de desfazimento desse patrimônio para quem tenha interesse em usá-los em afinidade com interesse público.
Via de regra, a alienação do patrimônio mobiliário da Administração Federal depende de avaliação prévia, em conformidade com os preços atualizados e praticados no mercado, e de licitação. Os bens móveis inservíveis para o Poder Público devem ser vendidos, mediante leilão, como prescreve o art. 22, V, § 5º da Lei de 8.666/93, in verbis:
“Art. 22. São modalidades de licitação:
(…)
V – leilão
(…)
§ 5o Leilão é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para a venda de bens móveis inservíveis para a administração ou de produtos legalmente apreendidos ou penhorados, ou para a alienação de bens imóveis prevista no art. 19, a quem oferecer o maior lance, igual ou superior ao valor da avaliação”
Bens móveis inservíveis são aqueles classificados como material ocioso, recuperável, antieconômico e irrecuperável, conforme art. 3º, par. único, “a” à “d” do Decreto nº 99.658/99, in literris:
“Art. 3º Para fins deste decreto, considera-se:
I - material - designação genérica de equipamentos, componentes, sobressalentes, acessórios, veículos em geral, matérias-primas e outros itens empregados ou passíveis de emprego nas atividades dos órgãos e entidades públicas federais, independente de qualquer fator;
(...)
Parágrafo único. O material considerado genericamente inservível, para a repartição, órgão ou entidade que detém sua posse ou propriedade, deve ser classificado como:
a) ocioso - quando, embora em perfeitas condições de uso, não estiver sendo aproveitado;
b) recuperável - quando sua recuperação for possível e orçar, no âmbito, a cinqüenta por cento de seu valor de mercado;
c) antieconômico - quando sua manutenção for onerosa, ou seu rendimento precário, em virtude de uso prolongado, desgaste prematuro ou obsoletismo;
d) irrecuperável - quando não mais puder ser utilizado para o fim a que se destina devido a perda de suas características ou em razão da inviabilidade econômica de sua recuperação”. (grifos nossos)
A licitação desses bens somente pode ser dispensada para fins de uso de interesse social, após avaliação da conveniência e oportunidade pelo gestor entre a dispensa e a realização do leilão, consoante art. 17, II, “a” da Lei nº 8.666/93:
“Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:
(…)
II - quando móveis, dependerá de avaliação prévia e de licitação, dispensada esta nos seguintes casos:
a) doação, permitida exclusivamente para fins e uso de interesse social, após avaliação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica, relativamente à escolha de outra forma de alienação;
Assim, o primeiro ônus do administrador que opta por doar bens é justificar por que a doação parece-lhe mais vantajosa do que o leilão. Trata-se apenas do dever de motivar o ato administrativo de acordo com as circunstâncias locais, a fim de superar a preferência legal pelo leilão.
Nesse particular, ensina o professor Jessé Torres Pereira Junior, a lei obriga o gestor “ao exame de dois elementos vinculantes da decisão de doar, como alternativa à alienação de outra espécie: (a) a finalidade a que se destinará o bem doado, que há de ser de interesse social; (b) a avaliação da oportunidade e da conveniência sócio-econômica da doação”.
A hipótese de doação é regulamentada pelo art. 15 do Decreto nº 99.658/90
“Art. 15. A doação, presentes razões de interesse social, poderá ser efetuada pelos órgãos integrantes da Administração Pública Federal direta, pelas autarquias e fundações, após a avaliação de sua oportunidade e conveniência, relativamente à escolha de outra forma de alienação, podendo ocorrer, em favor dos órgãos e entidades a seguir indicados, quando se tratar de material: (Redação dada pelo Decreto nº 6.087, de 2007).
(...)
II - antieconômico, para Estados e Municípios mais carentes, Distrito Federal, empresas públicas, sociedade de economia mista, instituições filantrópicas, reconhecidas de utilidade pública pelo Governo Federal, e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público; (Redação dada pelo Decreto nº 6.087, de 2007).
Diante desse quadro legal, devem constar do processo: (a) os motivos da escolha do donatário e a finalidade da doação; (b) os motivos da escolha da doação ao invés do leilão; (c) a caracterização dos bens como inservível; (d) a avaliação, ainda que sucinta, do bem doado.
Não há, nessa disciplina, um paralelismo de formas: a aquisição de bens móveis se dá, procedimentalmente, de forma distinta de sua alienação. Mas, em ambos os casos, há o interesse público subjacente, seja ao explicitar a necessidade pública que resultou na sua aquisição, seja ao embasar a alienação, demonstrando que o mesmo bem, diante da mudança das circunstâncias, seria melhor aproveitado por outro ente público ou mesmo entidades do terceiro setor.
Portanto, a doação de bens parte da discricionariedade do gestor, que analisa a conveniência e oportunidade em doar um pedaço do patrimônio público, mas se impõe como ato de gestão, de modo a dar o melhor tratamento à coisa pública sob sua guarda.
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