De acordo com o ensinamento de NOVELINO1, “a simples garantia formal do dever do Estado de prestar a Justiça não é suficiente, sendo necessária uma prestação estatal rápida, efetiva e adequada. Com esse intuito, a EC 45/2004 acrescentou o inciso LXXVII ao art. 5º, objetivando assegurar a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Concomitantemente, a referida Emenda estabeleceu que “o número de juízes na unidade será proporcional à efetiva demanda judicial e à respectiva população” (CF, art. 93, XIII)”.
Pois bem, mesmo antes da edição da referida emenda constitucional, o legislador infraconstitucional já vinha alterando o CPC para conferir maior efetividade à prestação jurisdicional. O texto constitucional veio apenas reforçar a necessidade de conferir aos cidadãos não só uma rápida solução, mas também que ela fosse eficaz. Nesta seara, ao tratar da audiência preliminar e da relevância do despacho saneador, algumas considerações devem ser tecidas.
A audiência preliminar (antes chamada de audiência de conciliação) será designada quando não for possível o julgamento antecipado da lide e que, também, não for cabível a extinção do processo sem apreciação do mérito (art. 331, CPC, com a redação dada pela lei n. 10.444/02).
Ainda, um dos objetivos primordiais de tal audiência é a tentativa de conciliação, tanto que o próprio Código prevê que ela não será realizada quando a demanda versar sobre direitos que não admitem a transação. Assim, pode-se concluir que a designação de audiência preliminar não é obrigatória, até porque há previsão expressa no CPC de sua facultatividade (artigo 331, §3º), quando as circunstâncias da causa evidenciarem ser impossível a transação.
MEDINA2 leciona que “ao designar inutilmente a audiência, além de praticar um ato desnecessário – o que viola o princípio da economia processual -, acaba-se por retardar a solução da lide, contrariando-se a garantia constitucional de duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF).
Ato seguinte determina o CPC que “o juiz poderá, desde logo, sanear o processo e ordenar a produção de prova, nos termos do §2º”. Tal providência visa oportunizar às partes a chamada especificação de provas. Ressalte-se que os litigantes já indicaram em suas peças inicias – petição inicial e contestação -, as provas que pretendiam produzir para comprovar o fato constitutivo e/ou impeditivo de seu direito (art. 282, inciso VI c/c art. 300, in fine, CPC).
Não há no CPC obrigatoriedade na especificação. Porém, a prática judicial consiste na intimação das partes para que o façam, visando evitar a designação de provas inúteis ao deslinde da causa. P. ex., nas demandas que versam sobre benefício por incapacidade contra o INSS, a Autarquia oferece os quesitos à perícia já na contestação, apenas os reiterando quando da manifestação acerca do despacho que a intima para especificar provas.
Por fim, ato seguinte do procedimento ordinário, o artigo 331 traz o chamado despacho saneador. Segundo THEODORO JÚNIOR3, “o despacho saneador, portanto, passou a ser aquela decisão que o juiz profere, ao final das providências preliminares, para reconhecer que o processo está em ordem e que a fase probatória pode ser iniciada, eis que será possível o julgamento do mérito e, para tanto, haverá necessidade de prova oral ou pericial”.
Havendo ou não audiência preliminar, ao final desta fase, deverá o Juiz adotar as providências contidas no parágrafo 2º do artigo 331 do CPC: fixar os pontos controvertidos, decidir as questões processuais pendentes e determinar as provas a serem produzidas, designando audiência de instrução e julgamento, se necessário.
A relevância do saneador reside no fato de o Juiz eliminar todo e qualquer entrave ao prosseguimento do feito, viabilizando a sua extinção sem resolução do mérito ou, de outra sorte, prosseguir normalmente até a resolução da demanda. O E. Superior Tribunal de Justiça4 decidiu que “não há como o julgador deixar de proceder ao despacho saneador, deixando in albis as preliminares suscitadas e passando diretamente para a fase de instrução e julgamento, presumindo-se, assim, que o processo encontra-se sanado, sob pena de nulidade absoluta do feito”.
Decididas as questões a que se refere o parágrafo 2º do artigo 331, e não havendo recurso das partes, o efeito será da preclusão da decisão. Segundo THEODORO JÚNIOR5, a preclusão abrange:
a)- as questões expressamente decididas, por provocação da parte ou ex officio. Não há, porém, preclusão em matérias de provas, pois, na verdade, o poder do juiz não é simplesmente o de deferir provas pleiteadas pelas partes, já que em qualquer fase do procedimento poderá determinar a realização de provas que entender pertinentes, por força do disposto no artigo 130 do CPC;
b)- as questões não decididas, mas implicitamente solucionadas pela declaração que julgar saneado o processo. Excetuam-se, porém, aquelas que possam, pelo sistema do próprio CPC, ser examinadas ex officio em qualquer fase do processo, como a incompetência absoluta, a nulidade insanável, a coisa julgada, os pressupostos processuais as condições da ação (artigo 267, §3º).
Por fim, quanto à facultatividade do despacho saneador e sua eficácia preclusiva, é o entendimento do E. Tribunal Regional Federal da 3a Região6:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL (ART. 557, § 1º, DO CPC). AUSÊNCIA DE DESPACHO SANEADOR. NULIDADE RELATIVA. DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. MANIFESTAÇÃO NA PRIMEIRA OPORTUNIDADE. ACOLHIMENTO DA PRELIMINAR. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. RETORNO DOS AUTOS À VARA DE ORIGEM. 1- A ausência do despacho saneador (art. 331, § 3º, do CPC) não gera nulidade do processo ou cerceamento de defesa caso não se demonstre efetivo prejuízo à parte, sobretudo quando propiciada a regular dilação probatória, na qual se produziram as provas requeridas. Precedentes: STJ, 1ª Turma, EARESP nº 724059, Rel. Min. José Delgado, j. 21/03/2006, DJU 03/04/2006, p. 252; TRF3, 10ª Turma, AC nº 2002.61.24.000547-6, Rel. Des. Fed. Sérgio Nascimento, j. 22/04/2008, DJF3 07/05/2008. 2- Conquanto ato passível de anulabilidade (nulidade relativa), deve o interessado alegar a falta de saneamento na primeira oportunidade que lhe couber falar nos autos, ex vi do art. 245, caput, do CPC, o que torna a matéria preclusa diante de sua inércia. Precedentes: TRF3, 7ª Turma, AC nº 2006.61.24.000330-8, Rel. Juiz Fed. Conv. Raul Mariano, j. 06/10/2008, DJF3 05/11/2008. 3- Demonstrado o prejuízo pela parte na primeira oportunidade que lhe coube falar nos autos, de rigor o acolhimento da preliminar de nulidade para anular a sentença de primeiro grau e determinar o retorno dos autos à vara de origem para o regular processamento do feito. 4- Agravo provido.
Assim, a despeito da obrigatoriedade ou não da designação de referidos atos no curso do processo, busca-se, com a sua realização, maior efetividade ao processo civil.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 3a edição. Editora Método. São Paulo. 2009. P. 454.
MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil Comentado. Editora RT. São Paulo. 2011. P. 325.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Volume 1. Editora Forense. Rio de Janeiro. 2011. P. 423.
REsp 780.285/RR. 1a Turma. J. 14.03. 2006. Rel. Min. Francisco Falcão.
Idem. P. 425.
APELREE - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO – 597301. Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES. DJF3 CJ1 DATA: 12/11/2010. PÁGINA: 1255.
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