A Constituição Federal estabelece em seu artigo 37,§ 6º, a responsabilidade objetiva da Administração Pública, na modalidade risco administrativo, quanto aos danos causados por seus agentes no desempenho da função pública:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
[...]
§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.
Por esta teoria, o Estado responde pelos danos, independentemente da demonstração de dolo ou culpa, basta comprovar o dano e o nexo de causalidade, ressalvados os casos de omissão da Administração Pública, cuja indenização eventualmente cabível regula-se pela Teoria da Culpa Administrativa.
Nesse viés, torna-se imperioso verificar como se daria a responsabilização pessoal do agente público causador do dano, ou seja, o responsável pela ação ou omissão geradora da responsabilidade civil.
Em uma interpretação literal do art. 37, §6º, da Constituição pode-se dizer que a responsabilidade civil do Estado independe da presença de um elemento subjetivo, já a responsabilização civil do agente estatal provocador do dano pressupõe a prova do dolo ou culpa.
O doutrinador Marçal Justen Filho apresenta uma visão atual sobre o enfoque da responsabilidade pessoal, que não poderíamos deixar de destacar:
“No atual sistema constitucional, todo agente estatal tem ciência da natureza funcional de suas competências e sabe que as ações ou omissões antijurídicas imputáveis ao Estado produzirão responsabilização civil. Exige-se do individuo a adoção de todas as cautelas para evitar a consumação de danos a terceiros.[...]
Ora, a simples consciência de que os cofres públicos poderão arcar com sérios prejuízos em virtude da conduta pessoal basta para impor um dever de grande cuidado e cautela ao agente estatal.
Portanto, a responsabilização civil do agente tende a uma objetivação de culpabilidade idêntica àquela que se processa quanto ao próprio Estado. ”
Em que pese o nobre pensamento do renomado autor sobre o assunto, ousa-se discordar em parte de sua posição, pois, não restam dúvidas de que o agente público está cada vez mais esclarecido de seus direitos e obrigações, contudo, buscar uma objetivação de sua responsabilidade de forma semelhante ao Estado seria extrapolar os limites do razoável, já que a Administração Pública dispõe do erário público para pagamento das obrigações de indenizar, ao passo que o agente público, caso seja condenado a indenizar, vai dispor somente de seus vencimentos para quitar o débito, ou seja, vai ser retirada de sua verba alimentar os valores de eventual indenização.
Assim, acredita-se que a busca da demonstração do dolo ou culpa do agente deve ser a mais robusta possível, evitando-se o enriquecimento sem causa de particulares em detrimento dos parcos vencimentos dos agentes públicos.
Por isso é que a orientação dominante na doutrina é no sentido de inadmissibilidade da denunciação à lide pela Administração Pública a seus agentes nos casos de reparação de dano, uma vez que a celeridade processual estaria prejudicada, em inegável desvantagem ao particular, bem como o contraditório poderia ser abalado na busca da celeridade, resultando em prejuízo ao agente público.
Não se duvida que a ação regressiva do Estado é o meio mais eficaz para se apurar as condutas do agente público, pois conduzida sob o enfoque do contraditório e ampla defesa específico. Além disso, tem-se nos termos do art. 37, §5º, da Constituição, que as ações de ressarcimento ao erário são imprescritíveis, muito embora o ilícito não o seja, o que resultaria em uma ação ajuizada com a devida cautela, sem a pressa contra uma eventual prescrição:
“A prescritibilidade, como forma de perda da exigibilidade de direito, pela inércia de seu titular, é um princípio geral de direito. Não será, pois, de estranhar que ocorram prescrições administrativas sob vários aspectos, quer quanto às pretensões de interessados em face da Administração, quer quanto às desta em face de administrados. Se a Administração não toma providência à sua apuração e à responsabilização do agente, a sua inércia gera a perda do seu ius persequendi. É o principio que consta do art. 37, § 5º, que dispõe: “A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízo ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.”
Como se percebe, cabe ao Estado, através da pessoa jurídica acionada pelo particular, depois de indenizá-lo, verificar se o agente público agiu com dolo ou culpa, para só então mover-lhe a ação regressiva para a cobrança dos valores despendidos. Nesse passo, se o agente público não operou dolosa ou culposamente, incabível será a ação regressiva, pois nada terá a pagar:
“o Estado indeniza a vítima, independentemente de dolo ou culpa desta, e o agente ressarce a Administração, regressivamente, se houver dolo ou culpa de sua parte, agente.[...]os efeitos da ação regressiva, sendo esta uma ação de natureza civil, transmitem-se aos herdeiros e sucessores do culpado. Portanto, mesmo após a morte do agente, podem seus sucessores e herdeiros ficar com a obrigação de reparar o dano (sempre respeitado o limite do valor do patrimônio transferido-CF, art. 5º, XLV).”
Por fim, em sendo a ação de ressarcimento ao erário imprescritível, o Estado pode ajuizá-la mesmo depois de terminado o vínculo entre o servidor e a Administração.
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