RESUMO: Pretende-se neste artigo abordar aspectos técnicos e experimentais sobre as Políticas de Segurança Pública estabelecidas pelos governos federal e estadual, alertando que a filosofia de segurança ostensiva no combate ao crime não é a melhor forma de solucionar os altos níveis de criminalidade apresentados nos dias atuais. Ao contrário, deve o Estado focar no trabalho de inteligência preventiva, onde os responsáveis pela Segurança Pública deverão fazer um estudo sistemático da gênese do crime, procurando esmiuçar a estrutura criminosa não só macroscopicamente, mas sobretudo microscopicamente, haja vista que na grande maioria das vezes o crime cresce e evolui dentro de pequenas comunidades. Analisando os planos de segurança de alguns estados federativos, percebe-se que a criminalidade tende a cair quando investimentos maciços na Polícia Judiciária são implementados, melhorando as investigações e tornando mais eficiente a persecução criminal, circunstâncias que diminuem o senso de impunidade arraigado no País e, consequentemente, aumentam o temor na correta e eficiente aplicação da lei. Este artigo está dividido em três partes: na primeira, foca a cultura brasileira em relativizar a Segurança Pública, colocando a mesma na periferia das ações governamentais. Na segunda, enfatizaremos os erros de tal conduta, verificando que o aumento da criminalidade é fruto da condução da Segurança Pública de maneira ortodoxa. E, na terceira, destacaremos soluções para diminuir a criminalidade, alocando a Polícia Judiciária como protagonista na redução da criminalidade.
Palavras-chaves: Segurança Pública; Investimento; Criminalidade
ABSTRACT: The aim of this article is to discuss technical and experimental aspects of public security policies established by the federal and state governments, warning that the philosophy of ostensive security in the fight against crime is not the best way to solve the high levels of crime presented today . On the contrary, the State should focus on the work of preventive intelligence, in which those responsible for Public Security should make a systematic study of the genesis of crime, seeking to break the criminal structure not only macroscopically but above all microscopically, since in the vast majority of cases crime grows and evolves within small communities. Analyzing the security plans of some federative states, crime tends to fall when massive investments in the Judiciary Police are implemented, improving investigations and making criminal prosecution more efficient, circumstances that reduce the sense of impunity rooted in the country and, consequently, increase the fear in the correct and efficient application of the law. This article is divided in three parts: in the first, it focuses the Brazilian culture on relativizing the Public Security, placing it in the periphery of the governmental actions. In the second, we will emphasize the errors of such conduct, verifying that the increase in crime is the result of conducting Public Security in an orthodox way. And, in the third, we will highlight solutions to reduce crime, allocating the Judiciary Police as a protagonist in reducing crime.
Keywords: Public Security; Investment; Crime
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. REVISÃO DE LITERATURA. 2. FALTA DE PROFISSIONALIZAÇÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA. 3. MANUTENÇÃO DE UMA ESTRUTURA ARCAICA DE SEGURANÇA PÚBLICA E SUAS CONSEQUÊNCIAS. 4. SOLUÇÕES PARA DIMINUIR A CRIMINALIDADE. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
Com a evolução da Sociedade, motivada certamente pelas inovações tecnológicas e culturais, variados problemas vão surgindo em progressão geométrica, enquanto o regramento e a disciplina jurídica avançam em progressão aritmética.
Em pleno século XXI, especialistas e leigos se deparam com problemas, cada vez mais difíceis, da falta de segurança pública no meio social, onde organizações criminosas comandam o crime nas barbas do Estado, ou melhor, sob a total proteção do Estado, determinando execuções e estruturando o tráfico de entorpecentes no interior do Sistema Penitenciário Brasileiro.
O Estado, através de seus representantes, não se profissionalizou, não evoluiu estrategicamente, querendo resolver os problemas atuais com os mesmos métodos do século passado, esquecendo que a Sociedade atual não é a mesma de outrora e, ao contrário da passada, cada vez mais se preocupa com as diretrizes adotadas na Segurança Pública.
Com efeito, a Segurança Pública, que era tratada perifericamente, haja vista não trazer votos para os governantes, passa a ser ponto central do jogo político, sobretudo quando se percebe que os eleitores se encontram, metaforicamente, em cárcere privado, motivado pelo real temor em, há qualquer momento, entrar nas estatísticas do crime pelo simples fato de sair de casa.
Neste diapasão, peca o Estado em amordaçar as Polícias Judiciárias, visto que é o trabalho de investigação e inteligência que proporciona informações imprescindíveis para o desmantelamento não só financeiro, mas estrutural da organização criminosa, ao ponto de esfacelar o arcabouço interno da mesma.
Noutra senda, os governantes erram em não procurar eficácia em suas legislações constitucional e infraconstitucional, dando valor a normas simbólicas, conforme entendimento do Prof. Marcelo Neves, com o simples desiderato em assegurar confiança nos sistemas jurídico e político. Contudo, esquecem que, a longo prazo, tais normas geram incerteza e insatisfação social, sobremodo se levarmos em consideração sua ineficácia em concretizar não só os direitos e garantias fundamentais, mas também os deveres que cada cidadão deve arcar para a manutenção, a paz e o desenvolvimento da coletividade em que convive.
Desta feita, tal estudo visa apontar a incompetência dos governantes frente à evolução da criminalidade, através de pesquisas bibliográficas e observações de campo, justificando que a real causa da crise é o não oferecimento de estrutura e dignidade aos agentes executores da segurança pública.
Alguns estudos foram encontrados sobre o assunto, contudo vislumbram a unificação das carreiras policiais ou a extinção do modelo atual, ao invés de focar na estruturação das polícias e profissionalização do ser policial.
Dentre tais estudos, causa susto a posição de José Lopes Hott, em artigo encaminhado à Revista Brasileira de Políticas Públicas, onde o autor enfatiza a extinção do modelo atual e, como solução, requer a implementação de uma polícia municipal como forma de diminuição da criminalidade. Entretanto, esquece o autor que os municípios brasileiros ainda são arraigados de coronelismo, onde clãs de famílias dominam o cenário político de forma avassaladora, circunstância que irá arrefecer a qualidade do trabalho investigativo caso os políticos locais tomem conta da segurança pública, haja vista que correligionários do governo local serão beneficiados com a gestão e, ao contrário, aqueles que são contra, serão perseguidos. Enfim, olvida o autor que um dos grandes entraves da qualidade investigativa é a falta de autonomia dos agentes da segurança pública.
Noutro enfoque, está o posicionamento de Luiz Flávio Gomes e Alex Agra, onde os autores veem que a questão é estrutural, social e histórica, visto que os governantes mantém uma cultura policial arcaica como forma de manutenção do poder.
Destarte, tal estudo enfoca na falta de sensibilidade dos governos em aliar a segurança pública ao seu plano de gestão, esquecendo que o crime é fator preponderante na economia estatal, pois localidades violentas tendem a se isolar do mercado de trabalho.
2. FALTA DE PROFISSIONALIZAÇÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA
Conquanto a Constituição Federal de 1988 tenha modernizado nosso ordenamento jurídico como um todo, recepcionando vários institutos democráticos aplicados no direito comparado, a Segurança Pública não recebeu qualquer modificação prática com relação ao modelo de investigação, se preocupando os constituintes com a estrutura e organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, mas olvidando a necessária eficiência da fase pré-processual, representada pelo Inquérito Policial.
Na visão de José Lopes Hott, em artigo publicado na Revista Brasileira de Políticas Públicas, os constituintes sequer tinham uma proposta homogênea para as polícias, circunstância que impediu uma mudança concreta e substancial do modelo de segurança, preponderando, destarte, a manutenção do arquétipo institucional do Código de Processo Penal da década de 40, in verbis:
Durante a assembleia constitucional, o Código de Processo Penal já trazia um arcabouço institucional todo fragmentado de um período marcado por um modelo militarizado de segurança pública. Os constituintes mais progressistas na ocasião não tinham proposta homogênea para as polícias e para a área de segurança pública. Com isso a subcomissão de segurança pública acabou sendo dominada pelos atores que defendiam a manutenção do arranjo institucional, fortemente influenciada por um lobby de 13 oficiais das forças armadas, sendo mantido o modelo do período ditatorial. (HOTT, José Lopes. A Polícia Judiciária e o Combate à Criminalidade. Disponível em: https://www.publicacoesacademicas.uniceub.br/RBPP/article/viewFile/2845/2561. 2015, acesso em 01 de abril de 2018)
Tal arranjo, como bem informa o autor, engessou o modelo de segurança pública nacional, fazendo com que os responsáveis pelas investigações dos diversos crimes não tivessem acesso a meios e técnicas de investigações modernas pelo simples fato de os congressistas não se preocuparem com o tema naquela ocasião, apesar da forte tendência em afastar os princípios e métodos aplicados durante a ditadura militar.
Não podemos esquecer que até hoje vigora no Brasil o método ostensivo de policiamento, onde os Governos, Federal e Estadual, prezam pela quantidade de viaturas e policiais nas ruas, logrando êxito apenas na resolução dos delitos de proximidade, presenciais, característicos de uma sociedade rural que havia em meados do século passado.
Com a redemocratização do Brasil, o país voltou a crescer exponencialmente nos mais variados aspectos econômicos, sociais, populacionais e criminais, fatores estes que modificaram o comportamento do individuo, seja para o bem ou para o mal. Certamente, o criminoso do século XXI não é mais aquele sem instrução, sem informações, sem contatos, enfim, não são neófitos, pois a evolução é inerente a todos os ares, dentre eles à criminalidade.
Assim, o atual modelo de segurança pública, que por razões politicas e de lobbys é o mesmo do século passado, não é capaz de conter a macrocriminalidade, onde diversos meliantes de forma estruturada, hierarquizada e organizada se associam para praticar os mais diversos delitos não só tangencialmente ao Estado, mas também usando o manto protetor do aparato governamental, não sendo desconhecido que tais organizações operam com a colaboração e participação de servidores públicos das mais variadas espécies.
Com efeito, os atores da segurança pública, desmuniciados de meios e técnicas modernas, apenas participam de um grande teatro da politica, disfarçando e dissimulando os problemas da segurança pública. É neste sentido ponto de vista colocado pelo mesmo autor José Lopes Hott, observemos:
Uma característica importante para que se dê o efeito simbólico do desconhecimento nesse processo de política pública de polícia judiciária é o fato de que seus atores estão dominados por um discurso e uma prática procedimental disputando um campo em que se virtualiza certa eficiência. Na verdade não têm alcançado o resultado pretendido, mas eles não percebem que estão submetidos a uma agenda de política pública repetindo uma mesma maneira de ação e pensamento que confirma o habitus existente. (HOTT, José Lopes. A Polícia Judiciária e o Combate à Criminalidade. Disponível em: https://www.publicacoesacademicas.uniceub.br/RBPP/article/viewFile/2845/2561. 2015, acesso em 01 de abril de 2018)
Uma visão deste tipo de ação estatal usada somente para dissuadir os profissionais de segurança pública e a sociedade em geral são as atividades ostensivas, onde gestores fazem um trabalho de marketing violento na exposição de números e estatísticas, sem se preocupar com o conteúdo de tais ações e sua eficiência em longo prazo. Por exemplo, imagine-se a prisão de um conhecido traficante de drogas de nível internacional sendo apresentada maciçamente na imprensa, informando que menos um traficante estará nas ruas. Tal situação vem desamparada do fato da real possibilidade deste traficante continuar seus negócios espúrios no interior do sistema prisional, nas barbas do Estado, não contribuindo, assim, na diminuição da criminalidade. Ao contrário, irá aumentar o senso de impunidade, pois não só o meliante preso, mas também seus comparsas e seus companheiros de presídio irão perceber e acreditar que o crime compensa, haja vista a ineficiência da justiça criminal como um todo.
Neste diapasão, os representantes do povo pecaram com a Segurança Pública ao não profissionalizá-la, perdendo quase 30 anos de aprendizagem caso a mesma fosse institucionalizada de maneira independente e autônoma na Constituição Federal de 1988, elevando a meritocracia como norteador da acessão profissional, ao invés das indicações políticas que mais impedem a aplicação da lei penal de forma isonômica, visto que quem assume cargos comissionados dificilmente investigará aqueles que o colocaram em tal posição.
Tal posição do Constituinte de 88, no tocante à Segurança Pública, expressa o modelo de Constituição Semântica instituída por Karl Loewensttein, onde as normas constitucionais são criadas apenas para justificar o autoritarismo do Poder, não pretendendo qualquer tipo de limitação e eficiência da norma. Citando Karl Loewenstein, Darley da Cunha Júnior assevera:
Esta classificação “ontológica” foi apresentada pelo autor alemão Karl Loewenstein levando em consideração a eficácia das Constituições em face da realidade. Assim, segundo ele, as Constituições podem apresentar, ante a realidade, como: a) Constituição normativa (com valor jurídico); b) Constituição nominal (sem valor jurídico, uma constituição de fachada), e c) Constituição Semântica (utilizada apenas para justificar juridicamente o exercício autoritário do poder, como, por ex, a Constituição Brasileira de 1937).
(...)
Finalmente, a Constituição semântica é aquela que em “su realidade ontológica no es sino la formalización de la existente situación del poder político en benefício exclusivo de los detentores del poder fácticos que disponen del aparato coactivo del Estado”. A Constituição semântica, ao invés de ser concebida como instrumento de limitação do poder, apresenta-se como instrumento a serviço do poder, de modo a estabilizar e eternizar a intervenção dos dominadores fáticos do poder político. Neste tipo de Constituição, “el traje no es en absoluto um traje, sino um desfaz”. (2014, apud Loewenstein, Teoria de la Constitución, p. 216-222)
Neste mesmo sentido é o posicionamento de Uadi Lammêgo Bulos:
Constituições semânticas – diversamente das anteriores, encontram-se submetidas ao poder político prevalecente. Trata-se de um documento formal criado para beneficiar os detentores do poder de fato, que dispõem de meios para coagir os governados. Se inexistisse constituição formal ou escrita, a vida institucional não sentiria qualquer diferença. O aparato coativo do Estado, posto ao dispor dos poderosos, funcionaria do mesmo jeito, a fim de privilegiá-los de alguma maneira. Karl Loewenstein compara a carta semântica a uma roupa que não veste bem mas dissimula, esconde, disfarça os seus defeitos. (BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 10ª Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2017. pag. 115)
Kyev Moura Maia arremata:
O termo “Constitucionalização Simbólica” trata-se da discrepância entre a função hipertroficamente simbólica (excesso de disposições carentes de aplicabilidade) e a insuficiente concretização jurídica de diplomas constitucionais. O conceito se deve ao Professor Marcelo Neves em estudo feito em 1992 para obtenção do cargo de professor titular da Universidade Federal de Pernambuco. O referido autor sofreu forte influência de constitucionalistas e teóricos alemães consagrados, como Horald Kindermann, Niklas Luhmann dentre outros autores, o que contribuiu para o desenvolvimento de sua tese sobre o tema. Marcelo Neves diz que a constituição simbólica é caracterizada pela falta de eficácia das normas/valores constitucionais. Isso é perceptível, segundo o autor, através da legislação e constitucionalização simbólicas. (MAIA, Kiev Moura, Breve análise acerca da Constituição Simbólica de Marcelo Neves, Disponível em: https://kyevm.jusbrasil.com.br/artigos/113984199/breve-analise-acerca-da-constituicao-simbolica-de-marcelo-neves, 2014, acesso em 17 de abril de 2018)
Destarte, o problema da Segurança Pública, diferentemente do que parte da imprensa joga ao público, não é do indivíduo policial, nem de um grupo determinado de policiais, ao contrário, é sistemático, histórico e estrutural, pois os governantes mais se preocupam com uma forma de manutenção do poder do que na real eficiência das investigações, não à toa insistindo na militarização das polícias, certamente para manter a doutrina de hierarquia e disciplina imprescindíveis para a governabilidade. É o que preceitua o Prof. Luiz Flávio Gomes:
Polícia militar “vs” polícia judiciária. Parece muito evidente que uma política de segurança militarizada acabe priorizando o segmento policial que garante a governabilidade, em detrimento daquele que auxilia a Justiça penal na descoberta dos crimes. Aliás, quanto mais ineficácia da polícia judiciária (a que investiga os crimes), melhor para quem comete abusos no exercício da segurança pública militarizada. A quantidade de recursos, de pessoal, de tecnologia etc., dada para a polícia militar, é incomparavelmente maior que a recebida pela polícia civil. Vale mais a garantia da governabilidade que a descoberta de delitos. Se a polícia civil (judiciária) não descobre tantos crimes, isso não derruba nenhum governo. Sem a garantia da polícia militar o governo corre sério risco de queda. Tudo estaria a explicar a desatenção daquela frente a esta. (GOMES, Luiz Flávio. Nova Polí(cia)tica de Segurança. 2012. Disponível em: https://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/121930678/nova-poli-cia-tica-de-seguranca. Acesso em: 25 abril 2018)
Esse é o mesmo pensamento de Alex Agra:
Para estudar os problemas do modelo das polícias no Brasil, é preciso entender que as contradições que o modelo de segurança pública apresenta vão além de obstáculos individuais, ou seja, questões de caráter ou formação de um policial (ou um grupo de policiais) específico(s). Trata-se de um empecilho sistemático muito bem colocado por um sistema criado para não funcionar. Visto isso, o objetivo dessa reflexão não será condenar ou isentar o policial enquanto indivíduo, mas entender que há em volta dele um contexto histórico, social e estrutural para que as limitações atuais existam. (AGRA, Alex. Estrutura e Indivíduo: Uma Análise Dialética da Segurança Pública no Brasil. Disponível em: https://jornalggn.com.br/noticia/uma-analise-dialetica-da-seguranca-publica-no-brasil-por-alex-agra. 2016. Acesso em 10 de abril de 2018).
Enfim, discutir segurança pública e almejar uma diminuição da criminalidade com a aposição de puro policiamento ostensivo apenas produzirá estatísticas de política criminal simbólica, mas não enfrentará a evolução do crime de maneira substancial, visto que as ações policiais não irão atingir o âmago da questão, qual seja: a estrutura criminosa.
3. MANUTENÇÃO DE UMA ESTRUTURA ARCAICA DE SEGURANÇA PÚBLICA E SUAS CONSEQUÊNCIAS
Não é difícil perceber que a maior consequência da involução da segurança pública nacional é o aumento da criminalidade e da impunidade, gerando vastas implicações em todo o sistema jurídico pátrio, mas também fortes efeitos na Sociedade, pois esta, ao invés de desfrutar sua liberdade de maneira pacifica e altiva, vive enclausurada em casas, prédios e condomínios fechados que os colocam como reais detidos na comunidade, temendo pela integridade física, moral e patrimonial de seus entes queridos.
Se olharmos nossa cultura urbanística do século XX, notaremos que a arquitetura das residências era pautada pelos muros baixos, residências térreas, portões defasados para uma visão melhor não só dos proprietários, mas também dos transeuntes que passavam naquele local. Tudo isso fruto de uma sociedade rural, onde grande parte dos habitantes ainda morava em sítios, fazendas e gozavam de uma relativa segurança e paz em seu recanto bucólico.
Em pleno século XXI, o país evoluiu econômico e financeiramente, usufruindo a população de prazeres e vícios de países de primeiro mundo, adquirindo objetos considerados de luxo, viajando para os mais longínquos lugares, seja dentro ou fora do país. Todavia, os sabores do capitalismo são acompanhados dos dissabores do aumento indiscriminado da população, aumento este que não raro é seguido pela ampliação acelerada de favelas, que em 100% dos casos não possuem condições dignas de sobrevivência, resultando, ulteriormente, em campo fértil para a criminalidade.
É com esse dado social que os constituintes de 88 deveriam focar para efetivar a segurança pública de forma moderna e eficiente, implementando ações de inteligência para coibir o crescimento da criminalidade nas periferias. Porém, divergentemente, viu no crescimento de favelas um terreno fértil para a captação de votos de cabresto, usando a ignorância e a pobreza como trampolins para a manutenção do poder pelo poder. Neste sentido é o posicionamento do jornalista Marcos Rolim:
Via de regra, os gestores da segurança pública no Brasil são pessoas que pouco ou nada sabem sobre o tema e que, não raro, administram suas pastas com a sensibilidade aguçada por objetivos eleitorais. Os governantes, por seu turno, quando pensam em “resultados” em segurança pública, apostam em projetos que permitam a capitalização política a curto prazo, desprezando todas as iniciativas que demandem um tempo maior de maturação. Na maior parte das vezes, autorizam as políticas na área sem que estas tenham sido selecionadas a partir de um diagnóstico competente e sem que elas próprias sejam um momento coerente dentro de um plano racional de segurança. Como tais iniciativas não são avaliadas, não é possível afirmar nada a respeito da sua eficácia. Os eventuais “resultados” serão sempre aqueles que seus proponentes divulgarem como peças de marketing. (ROLIM, Marcos, Revista Brasileira de Segurança Pública, Ano 01, Edição 01, 2007, Disponível em: https://ftp.jornalggn.com.br/sites/default/files/documentos/caminhos_inovacao_seg_br.pdf, Acesso em 29 de abril de 2018)
Entrementes, com a globalização social, o descontrole urbanístico, social e do próprio crime, que era restrito as periferias, ultrapassa e invade os espaços outrora pertencentes à alta sociedade, tornando a segurança pública, que antes era tratada de maneira relativa, no foco principal das discussões políticas, sobretudo pela mudança do farol do crime, antes voltado para as favelas e hoje, indiscutivelmente, direcionado para a classe abastada.
Contudo, por mais que a segurança pública seja tratada com a devida importância nos dias de hoje, ainda há uma resistência incomum para a inovação, para a modificação da estrutura, usando os governos das mesmas receitas, só que em doses maiores, para controlar o excessivo aumento da criminalidade, circunstância que compõe o problema a ser enfrentado.
Para ter uma ideia do descaso governamental, o art. 144 da CF/88 elenca e descreve as instituições envolvidas na segurança pública e prevê a elaboração de uma lei que a regulamentará.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos.
§7º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.
Todavia, quase 30 anos após a Constituição Federal de 1988, nenhuma lei foi aprovada para regulamentar a segurança pública, comprovando que o assunto não é tratado como papel central do governo, ao contrário da Saúde e da Educação.
Com efeito, não existe qualquer padronização nacional da estrutura mínima das policias nem de sua formação básica, bem como inexistem mecanismos de coordenação e integração das várias policias dos estados federados, ou seja, ao invés de haver um trabalho focado, uniforme e metodológico, há uma variedade de modos e formas que mais atrapalham do que ajudam, diluindo esforços no combate à criminalidade. Tal assertiva é corroborada pelo fato de que só recentemente foi criado um ministério para o setor.
Outrossim, as políticas de segurança pública dão importância ao puro policiamento ostensivo, se preocupando os governantes apenas com a exposição social das estatísticas criminais, ao invés de focar no combate à redução estrutural do crime.
Desta forma, nos parece ser estreme de dúvidas que discutir a pauta da segurança pública e a redução da criminalidade em uma perspectiva lógica de puro policiamento ostensivo converter-se-á em produzir estatísticas de política criminal simbólicas, ilustradas por números de intervenções policiais jamais traduzidos em números de redução de índices de criminalidade. Destarte, os dados sempre conduzirão a uma aparente ausência de correlação entre o trabalho policial e o seu impacto na redução da criminalidade.
Enfrentar a criminalidade através de policiamento preventivo, desacompanhado de investigações substanciais pela polícia judiciária, não reduzirá efetivamente a violência, ao contrário, apenas mudará o espaço de atuação do crime organizado, haja vista a manutenção de seu aparelhamento criminoso, traduzindo, assim, uma politica figurada de enfretamento ao crime.
Soma-se a isso o fato de que o próprio policial resiste à inovação em decorrência de uma cultura policialesca voltada simplesmente a repressão por repressão, sem se preocupar com a finalidade geral negativa da pena, no que concerne ao poder intimidativo que ela representa a toda a sociedade, destinatária das normas em geral. Excelente ponto de vista é exposto pelo jornalista Marcos Rolim, na Revista Brasileira de Segurança Pública, in verbis:
Assim, para todos aqueles que estão acostumados a um tipo de abordagem repressiva e que imaginam que a atividade policial seja exclusivamente isso, será, por certo, bastante difícil operar uma transição para um modelo fundado em outras premissas; um modelo em que, por exemplo, a repressão esteja subordinada a uma racionalidade preventiva. Por óbvio, a resistência à inovação oferecida pelas instituições policiais não é apenas motivada por diferenças culturais ou ideológicas. Ocorre que o atual modelo de polícia tem permitido também que determinados interesses particulares, articulados ilegalmente e mesmo em estreita colaboração com grupos criminais, tenham fincado raízes nas instituições policiais. Reformas, então, também ameaçam práticas altamente lucrativas já acomodadas na instituição, e que beneficiam parte das elites policiais. Assim, como diria Maquiavel, “o inovador tem por inimigos todos aqueles que obtinham vantagens com as velhas instituições”. (ROLIM, Marcos, Revista Brasileira de Segurança Pública, Ano 1, Edição 01, 2007, Disponível em:https://ftp.jornalggn.com.br/sites/default/files/documentos/caminhos_inovacao_seg_br.pdf, Acesso em 29 de abril de 2018)
Não podemos olvidar que é da tradição e cultura brasileira a militarização das policias urbanas para a prática do policiamento ostensivo, circunstância que engessa ainda mais a segurança pública, pois tal modelo é incapaz de investigar os novos crimes e delinquentes, mais estruturados e preparados intelectualmente. Zaffaroni, citado por Luiz Flávio Gomes relata isso com astúcia cirúrgica, in verbis:
O modelo policial militarizado, hierarquizado, de ocupação territorial e com capacidade de arrecadação autônoma está esgotado na globalização, porque é incapaz de fazer frente às novas formas de tráficos e mesmo ao delito convencional. Ele gera uma forte desconfiança na população, o que repercute no esclarecimento dos delitos: as pessoas resistem em testemunhar, temem represálias, e, com ou sem fundamento, suspeitam que os funcionários possam ser cúmplices ou encobridores. É um modelo suicida, que serviu para uma sociedade estratificada ou oligárquica, mas que hoje destrói uma instituição necessária, porque vai anulando sua função manifesta, perde eficácia preventiva, os comandos médios escapam ao controle, não é possível controlar a corporação quando excede certa dimensão, o recrutamento indiscriminado permite que se infiltrem algumas pessoas que pretendem montar seus próprios sistemas de arrecadação, associando-se à delinquência comum, a imagem do Estado se deteriora, a decepção se espalha. (GOMES, Luiz Flávio. Nova Polí(cia)tica de Segurança. 2012. Disponível em: https://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/121930678/nova-poli-cia-tica-de-seguranca. Acesso em: 25 abril 2018)
Enfim, tratar a segurança pública de maneira arcaica só tende ao aumento da criminalidade, pois com a falta de investimentos e de políticas públicas substanciais nesta área o país estanca em todos os aspectos, dentre os quais o econômico, haja vista a preocupação dos empresários com os prejuízos patrimoniais da ação criminosa.
4. SOLUÇÕES PARA DIMINUIR A CRIMINALIDADE
Incialmente, devemos ter em mente que soluções encontradas para qualquer problema passam pela constatação de que várias áreas devem ser analisadas e estudadas profundamente, visto que cada aspecto contribui para o nascimento da dificuldade. Com a segurança pública não é diferente, principalmente ante o fato de que ela tem como base o aspecto social, donde emerge o pluralismo de personalidades e de ambientes que favorecem ou não o crime.
Com efeito, devemos nos esmiuçar em três pontos imprescindíveis para uma melhoria da segurança pública e a consequente redução da criminalidade, quais sejam: Monitoramento de Crianças e Adolescentes; Sistema Penitenciário; e Valorização da Polícia Judiciária e Cientifica.
Por mais que este artigo não tenha o objetivo principal de tecer os erros das politicas sociais empreendidas pelos diversos governantes, sabido é que a falta de educação, saneamento básico, urbanismo, dentre outros, são terrenos férteis para o surgimento do crime, onde jovens são flertados e cooptados sob a influência do dinheiro fácil e prazeroso, mas também pela circunstância da total ausência estatal. Maior exemplo dessa assertiva são as favelas, locais esquecidos há tempos pelos governantes e que foram totalmente dominados por organizações criminosas e milícias, submetendo seus moradores a regras paralelas, sob pena de morte.
Estudos realizados pelo IPEA, com o intuito em mapear as condições educacionais nos territórios prioritários, no âmbito do Pacto Nacional pela Redução de Homicídios (PNRH), constatou que para cada 1% a mais de jovens entre 15 e 17 anos nas escolas, há uma redução de 2% na taxa de assassinatos, ou seja, o investimento em educação é responsável pela diminuição da criminalidade e passo essencial para a eficiência da segurança pública, pois o jovem ou adolescente não fica ocioso no seu dia a dia.
Ademais, relatório do Banco Mundial constatou que 52% da população jovem do Brasil, o que representa quase 25 milhões de pessoas, estão fora da produtividade, incluindo nesta conta 11 milhões de jovens que nem trabalham, nem estudam, tornando-se alvos fáceis para a entrada no crime. Tal estudo também ressaltou que não só a moradia, como também a renda, influenciam na redução dos homicídios, circunstância que corrobora a constatação de que o grande problema da criminalidade é a ausência estatal.
Assim, cabe ao Estado, através dos seus diversos órgãos, monitorar de perto o comportamento escolar e social do adolescente, buscando intervir o quanto antes nas suas ações, procurando em tempo integral afastar o jovem das intensas investidas do crime.
Um segundo ponto para redução da criminalidade é tornar eficiente o sistema penitenciário nacional. Não precisa ser especialista no assunto para saber que o sistema penitenciário está falido e que grande parte dos crimes cometidos no país é ordenado e planejado de dentro dos presídios, local que hodiernamente serve de base para a maior organização criminosa do país: O PCC.
O então ministro da justiça (1992-1994) e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Maurício Correia, proferiu sabias palavras sobre o assunto, in verbis:
A questão penitenciária do Brasil é grave. Sua solução extremamente complexa. E o ponto de partida é a compreensão de que, enquanto persistirem as causas geradoras da criminalidade violenta, enquanto não se reformular o sistema penal brasileiro – destinando-se os presídios somente aos efetivamente perigosos -, nenhum Governo conseguirá equilibrar o sistema penitenciário. A solução está, assim, integrada à reorganização do Estado, ao estabelecimento de políticas públicas eficientes e justas, com vistas ao bem-estar de toda a sociedade.
Primeiramente, temos que frisar que prendemos mal. Existe no país uma cultura do encarceramento onde tudo deve ser resolvido mediante a prisão, tornando as prisões cautelares, preventiva e temporária, como a regra, ao invés da exceção, da ultima ratio, situação que coloca agentes de alta periculosidade misturados com investigados/réus/condenados primários ou que tenham praticado crimes de pequeno grau de reprovabilidade. Um grande exemplo é a convivência de presos encaixados na lei Maria da Penha com autores de homicídios e latrocínios, conjuntura que possibilita uma corrupção daquele apenado, pois, na grande maioria das vezes, encontra-se em posição delicada dentro do sistema penitenciário, sendo obrigado a praticar condutas ilícitas por forte influência emocional, não raro sob ameaça de morte.
Assim, as modificações trazidas pela lei 12.403/11 devem ser aplicadas veementemente pelos órgãos judiciários, colocando as prisões cautelares não só como ultima ratio, mas também como meio para reprimir apenas crimes violentos e aqueles que mais causem danos à Sociedade, ao contrário do que acontece nos dias atuais, onde um autor de um furto é comparado a homicidas e traficantes de drogas.
Um segundo ponto sobre o sistema penitenciário é o controle das saídas, temporária ou definitiva, dos presos. Cabe ao Poder Público vigiar tais indivíduos como forma de politica criminal, pois é comprovado que grande parte dos egressos volta a delinquir no retorno ao convívio social.
Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), feita em 2015, mostrou que a cada quatro ex-presidiários, um volta a cometer crimes no prazo de cinco anos, isto é, cerca de 25% do total dos presos são reincidentes. Desta forma, se houver um controle na ressocialização do agente infrator, tal taxa tende a cair, reduzindo, consequentemente, o número de delitos.
Saliente-se que a lei de execução penal (lei nº 7.910/84), produzida há mais de 30 anos, elenca a colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar, quanto ao regime semi-aberto, e a casa de albergado, quando ao regime aberto, como institutos imprescindíveis para a progressão de regime, onde a autodisciplina e o senso de responsabilidade do condenado são postos em destaque para seu retorno ao convívio social. No entanto, passados mais de 30 anos, tais estabelecimentos não são colocados em prática, tornando a ressocialização quase impossível.
Nessa toada, cabe ao Estado controlar o retorno do apenado à sociedade, dando amparo institucional e social, dando oportunidade para que o mesmo volte ao mercado de trabalho através de cursos promovidos tanto dentro quanto fora do estabelecimento criminal, pois, só assim, o meio que influenciou o agente infrator para o cometimento do crime será substituído pelo meio da educação, do trabalho e do esforço individual, gerando, consequentemente, uma modificação do estilo de vida do condenado que resultará a longo e médio prazo a redução da criminalidade.
Por fim, o investimento maciço no trabalho investigativo é conditio sine qua non para o desmanche do crime organizado.
Como já foi frisado anteriormente, o policiamento ostensivo não é o meio hábil para desvendar os crimes e as estruturas criminosas do século XXI, nem mesmo as investigações realizadas outrora são eficientes no deslinde dos casos atuais. Resolver um caso sem qualquer prova técnica, com apenas provas testemunhais, não condiz com a qualidade do crime organizado, sobretudo quando este coage testemunhas no decorrer da persecução criminal.
Os responsáveis pela segurança pública devem modificar sua forma de atuação, investindo em tecnologias e aprimorando a capacidade do efetivo policial, bem assim desmembrar a Polícia Judiciária das outras policias, haja vista seu trabalho de apoio à jurisdição.
Desta feita, imprescindível a autonomia da polícia judiciária e a extensão das garantias dos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público aos Delegados de Polícia, pois, além de os mesmos serem considerados como exercentes de atividades jurídicas, suas funções são essenciais à consecução dos objetivos pautados pela justiça. Francisco Sannini Neto da sua opinião sobre o assunto:
De fato, as funções de apoio ao Poder Judiciário e a apuração de infrações penais repercutem diretamente na consecução da Justiça. Ao cumprir um mandado de prisão, por exemplo, as polícias Civil e Federal viabilizam a execução de uma pena ou asseguram a instrução processual. Por outro lado, através de investigações criminais, as polícias judiciárias conseguem reunir elementos probatórios que demonstram a justa causa necessária para o início do processo, instrumento indispensável para se chegar legitimamente à pena.
Conclui-se, pois, que as atividades exercidas pelas polícias judiciárias estão diretamente ligadas à Justiça e apenas indiretamente ligadas à segurança pública. Por óbvio, na medida em que se assegura a responsabilização penal do autor de um crime, de maneira reflexa também se contribui para a redução da criminalidade, uma vez que, quanto maior a eficiência da investigação criminal, maior a certeza da punição do criminoso, que, nesse cenário, será desestimulado a delinquir.
Um exemplo da eficiência da investigação criminal na redução das estatísticas criminais envolve o delito de extorsão mediante sequestro, previsto no artigo 159, do Código Penal. No final da década de 1980, houve uma explosão de extorsões mediante sequestro, sendo que vários empresários foram vítimas dessa infração, fazendo com que o Congresso Nacional editasse a Lei 8.072/90, criando os crimes hediondos e impondo os maiores rigores para os seus autores.
Destaque-se, todavia, que não foram esses rigores jurídico-penais os responsáveis pela redução das extorsões mediante sequestro, mas um sistema eficiente de investigação criminal. Foi a probabilidade de não obter êxito no seu ímpeto criminoso que resultou na redução desse tipo de crime. Nesse contexto, salta aos olhos a importância das polícias judiciárias na promoção e concretização da Justiça.
Não é outro o magistério de Zacariotto, senão vejamos:
(...) Deve a polícia judiciária ser tão-somente identificada como a atividade de pesquisa, necessariamente desenvolvida dentro dos parâmetros garantidores de isenção e de justiça, voltada à elucidação da verdade sobre os fatos considerados transgressores às leis penais, assim mirando, e em caráter restritivo, proporcionar condições excelentes ao Poder Judiciário para a aplicação do direito em face do aclarado caso concreto. No Estado Democrático de Direito, o exercício policial judiciário somente se fará legítimo quando balizado por um único e exclusivo compromisso, firmado não com a administração e/ou segurança públicas, mas sim, e cogentemente, com os fins de justiça criminal. (NETO, Francisco Sannini. Polícia judiciária está funcionalmente vinculada ao sistema de Justiça Criminal. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-fev-23/francisco-sannini-policia-judiciaria-vinculada-justica-criminal. 2018. Acesso em 30 de abril de 2018)
A autônima administrativa e financeira das policias judiciárias é de fundamental importância sobre a qualidade das investigações, visto que não raro intervenções politicas são usadas para travar diligências contra apadrinhados e membros dos poderes, dificultando a responsabilização penal de forma isonômica. Tais intervenções foram percebidas no curso da Operação Lava Jato, onde todos os envolvidos na persecução penal sofreram retaliações de todas as formas com o único desiderato em descrer o trabalho investigativo.
Com a autonomia administrativa e financeira, os membros da polícia judiciária podem investir maciçamente em tecnologia e aperfeiçoamento investigativo, ministrando e investindo em cursos, softwares e aparelhos que facilitariam o desenvolvimento e o rumo das investigações.
Divergentemente, os governantes raramente investem em tecnologia e inovações, certamente temerosos que as investigações recaiam sobre suas pessoas. Um bom exemplo foi a inserção da delação premiada no ordenamento jurídico pela lei 12.850/13, a qual foi amplamente criticada por representantes de um partido politico pelo seu uso no âmbito da Operação Lava Jato, todavia, esquecem tais críticos que a aprovação, promulgação e sanção de tal legislação foi pelo Presidente da República filiado ao próprio partido!!!
Nesta senda, percebe-se que o grande obstáculo das investigações criminais no país é fruto da falta de recursos suficientes para o desenvolvimento das diligências e não de quem desempenha essa função.
Corroborando este pensamento, vê-se a quase inexistência de policias cientificas na atuação policial, sendo hábito arraigado no país, de norte a sul, a modificação do local do crime não só por policiais, mas também por transeuntes, circunstância que resulta na qualidade dos procedimentos policiais e judiciais, já que a investigação desagua no processo penal propriamente dito.
Enfim, deve os governantes proporcionar uma revolução no país em termos de segurança pública, aplicando inovações com o fim em controlar e monitorar a criminalidade através dos novos recursos tecnológicos, dentre eles o uso de câmeras, mapeamento de DNA, reconhecimento de voz, de face, dentre outros.
Este trabalho teve como objetivo explanar as dificuldades enfrentadas pelos agentes de segurança pública no trato com o aumento vertiginoso da criminalidade, principalmente tendo em vista a inexistência não só de meios, mas também de incentivos, para que tais servidores possam atuar de maneira eficaz e diligente contra o crime organizado que assola e se irradia nas mais diversas regiões deste país com limites geográficos continentais, circunstância que dificulta sobremodo o combate ao crime.
No primeiro capítulo, teço comentários sobre a falta de profissionalização da segurança pública, enfatizando que tal tema nunca foi abordado de maneira relevante pela assembleia constituinte no instante de formalização da Constituição de 1988.
Já no segundo capítulo, analiso que os governantes, mesmo sabendo do modelo arcaico de segurança pública existente em nosso país, ainda mantém a mesma nos mesmos moldes de outrora, tanto que 30 anos após a confecção de nossa Carta Magna, nenhuma lei foi discutida para regulamentar a segurança pública.
Outrossim, no terceiro capítulo, indico que a forma de mudar tal estrutura é implementando e concretizando, pelo Estado, meios e técnicas inovadoras para inserir a inteligência como núcleo essencial no combate ao crime organizado, valorizando o trabalho de Polícia Judiciária e Polícia Científica para que ambas colham o maior número de elementos de informações imprescindíveis para a investigação criminal, com o fim mediato em embasar o decisum judicial e, consequentemente, robustecer a responsabilidade daqueles que atuam contra o Estado Democrático de Direito.
Desta feita, conclui-se que o grande problema do aumento descontrolado da criminalidade é consequência da falta de interesse governamental, onde os governantes se preocupam apenas em propagar estatísticas simbólicas para ludibriar a sociedade, a qual, ultimamente, vem sofrendo em demasia com a violência urbana.
Ademais, é sabido que o nosso sistema de justiça criminal facilita a impunidade, sendo necessário o rompimento do modelo ostensivo de combate à criminalidade existente no século passado e a imperiosa reformulação dos mecanismos de investigação para um melhoramento da persecução criminal, medidas que só se realizam com investimentos significativos na policia judiciária e cientifica, com o fim em dar uma maior eficiência aos procedimentos policiais e, consequentemente, reduzir os números assombrosos da criminalidade dos dias atuais.
Enfim, entendo que tal trabalho atingiu seu objetivo em expor as dificuldades encontradas no combate à criminalidade, mas também alcançou seu intento principal em propor uma revolução na segurança pública, alocando a inteligência como peça fundamental contra o crime organizado.
AGRA, Alex. Estrutura e Indivíduo: Uma Análise Dialética da Segurança Pública no Brasil. Disponível em: https://jornalggn.com.br/noticia/uma-analise-dialetica-da-seguranca-publica-no-brasil-por-alex-agra. 2016. Acesso em 10 de abril de 2018.
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ROLIM, Marcos, Revista Brasileira de Segurança Pública, Ano 01, Edição 01, 2007, Disponível em: https://ftp.jornalggn.com.br/sites/default/files/documentos/caminhos_inovacao_seg_br.pdf, Acesso em 29 de abril de 2018.
Mestrando em Direito Empresarial pela FUNIBER. Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Faculdade Unyleya. Delegado de Polícia do Estado de Pernambuco, onde atuou em investigações contra o Crime Organizado, i.e, Assaltos a Bancos, Corrupção de Chefes do Poder Executivo, Tráfico de Entorpecentes, etc. Detentor de cursos de inteligência financeira e operacional. Professor de Direito Processual Penal na Faculdade do Sertão do Pajéu - FASP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERNANDES, Ubiratan Rocha. A problemática da segurança pública nos dias atuais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 out 2019, 05:12. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53628/a-problemtica-da-segurana-pblica-nos-dias-atuais. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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