ANDREA LUIZA ESCARABELO SOTERO[1]
(orientadora)
RESUMO: Mediante a obrigatoriedade legal no atendimento das mais variadas necessidades da sociedade, cabe ao Estado, sendo o mesmo incapaz de oferecer serviços públicos que atendam a tanta demanda, buscar formas inovadoras de prestação, agilizando os atendimentos e diminuindo os custos para a máquina pública. Mediante isso, nasce a importância do terceiro setor, que é integrado pelas organizações privadas que se comprometem com o desenvolvimento de serviços públicos em prol da coletividade, por meio da formalização de parcerias com o Estado, tratando-se de uma manifestação da sociedade civil, para garantir a realização dos direitos fundamentais do indivíduo. O terceiro setor tem sua atuação ao lado do Estado como um facilitador do desenvolvimento das políticas públicas, portanto não se trata de transferência da competência, pois esta continua a ser de titularidade do Estado que possui o dever de tutelar e fiscalizar os serviços prestados pelas organizações parceiras e zelar pela máxima valorização dos recursos e patrimônios públicos.
Palavras-Chaves: Terceiro Setor; Poder Público; Parcerias.
ABSTRACT: Due to the obligation by law to provide Public services that society needs, and the State doesn’t have the capability to assist so huge demand, they should looking for ways to minimize the poor service offered and aims to cost reduction in the Public coffers. Before this unfavorable view, growing up the importance of this indispensable public sector called: "Third Sector". This department consists of nonprofits companies engage to development of public services on behalf of the whole group trough "Public-private partinerships" that’s the goal is to warranty the fundamental citizen rights. The Third sector is an enabler of a State Public Politics development working side-by-side to the State and its doesn’t mean the State is transferring their responsibility, it’s not-transferable. The State has the duty of tutor and to monitor of compliance the services provided by this partnerships and as indispensable, supervise in order to warranty the proper use of Public funds.
Keywords: Third Sector; State; Partnerships
Sumário: 1 Introdução – 2 Terceiro setor e seu papel dentro da sociedade civil. 3 Previsão constitucional da participação do terceiro setor nos principais serviços de interesse público. 4 Organizações do terceiro setor; 4.1 Organizações Sociais; 4.1.2 Contrato de Gestão; 4.2 Organizações da sociedade civil de interesse público; 4.2.1 Termo de parceria; 4.3 Organização da sociedade civil. 5 Conclusão. 6 Referência.
1 Introdução
O presente estudo tem como objetivo despertar o interesse e esclarecer pontos obscuros da população em geral, e também dos administradores, dirigentes e servidores públicos por esta área que atua no desenvolvimento de serviços de interesse público.
O terceiro setor trata-se de um tema pouco conhecido e explorado, porém que vem crescendo de forma auspiciosa, portanto, merece um estudo esclarecedor de suas funções, objetivos e importância para as políticas públicas.
Ponto importante da dinâmica do terceiro setor está em sua proximidade com o receptor do serviço de interesse público, dando oportunidade ao mesmo de utilizar e avaliar o serviço de maneira menos burocrática, pois a organização parceira está normalmente inserida na comunidade desses usuários, fazendo parte de seu cotidiano.
Muitas pessoas da sociedade acreditam que as organizações do terceiro setor não possuem organização administrativa e tão pouco sistemática jurídica, o que se apresenta como uma impressão erronia, pois organizações que não busquem se adaptar as grandes formalizações existentes, e que serão demonstradas, logo perderão seu lugar ao sol, pois não há mais espaço para o amadorismo.
O modelo de prestação de serviços públicos de forma direta e exclusiva pelo Estado envelheceu, portanto gerou a necessidade de uma vivacidade nas sistemáticas de execução de suas atividades, para isso busca parcerias com organizações realmente qualificadas (juridicamente e administrativamente) para o atendimento das necessidades da coletividade.
Porém essa sistemática de parcerias é bem antiga no Estado Brasileiro e a prática foi amplamente recepcionada pela Constituição da República, como restará comprovado, devido ao fato da mesma, expressar autorização para que o Estado se utilize dessa força de trabalho tão colaboradora.
O terceiro setor, em colaboração com o Estado, tem como principais áreas de atuação a saúde, assistência social e educação. As denominações mais comuns para as organizações parceiras, com base na doutrina moderna são: Organizações da Sociedade Civil (OSC), Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e Organizações Sociais (OS).
Contudo, jamais se esquecendo de que não somente de boas intenções vive o homem, e que, não é novidade que no Brasil, onde circula dinheiro, circula também a corrupção. Portanto, caberá ao Estado controlar e fiscalizar os recursos e bens públicos que transfere a terceiros, e como será esclarecido ao longo do trabalho, os mecanismos de controles são eficientes, leis para punir a corrupção existem, basta que o Estado cumpra com sua competência legal de zelar pelos tributos que recolhem dos filhos da Pátria.
O estudo do presente trabalho foi desenvolvido por meio de pesquisa no ordenamento jurídico brasileiro, dentre as leis que regem os aspectos legais do terceiro setor, contando com Constituição da República de 1988, e dentre as leis ordinárias pode citar: lei federal nº 9.637/1996; lei federal nº 9.790/1999, lei federal nº 13.019/2014.
Em complementação aos estudos das leis, ocorreu pesquisa bibliográfica, voltada ao esclarecimento do entendimento doutrinário dos ditames legais e para obter um estudo jurídico fortalecido com importantes autores como: (Almeida Junior 2019; Mendes; Branco 2018; Carvalho Filho 2018; Zanela Di Pietro 2014; e Justen Filho 2014).
2 Terceiro setor e seu papel dentro da sociedade civil.
O chamado terceiro setor surgiu sob a égide da Constituição de 1988, em uma tentativa de suprir novas demandas sociais, em grande parte gerada justamente pelo advento da Constituição cidadã, pródiga no reconhecimento de direitos e garantias típicos do Estado Social. (Gilmar Ferreira Mendes; Paulo Gustavo Gonet Branco, 2018, p. 1412).
O Terceiro setor é composto por pessoas jurídicas de direito privado, constituídas pela iniciativa privada, ou seja, pela sociedade civil, com o intuito de desenvolvimento de serviços em prol coletividade, normalmente, mas não obrigatoriamente, em colaboração com o Estado.
Para Marçal Justen Filho (2014), a denominação Terceiro Setor vem do entendimento doutrinário de que o Primeiro Setor é o próprio Estado, o Segundo Setor é formado pelo mercado, e o Terceiro Setor é formado pelas associações privadas sem finalidade lucrativa, o que o faz diferente dos demais, pois não fazem parte da Administração Pública e nem exploram atividade econômica.
José dos Santos Carvalho Filho (2018), esclarece que o terceiros setor resulta da iniciativa da sociedade civil, na execução de funções basicamente sociais, sem almejar resultados lucrativos, diferentemente das pessoas jurídicas empresarias no geral, e que além da prestação de serviços públicos realizadas de forma direta, o Estado pretende se desenvolver executando os referidos serviços pelo regime de parcerias, que se caracterizam pela aliança formada entre o Poder Público e associações privadas, que atualmente pela doutrina mais moderna são denominadas de Organização da Sociedade Civil.
Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco (2018) ponderam, que a crescente demanda pela efetiva prestação de serviços de tradicional incumbência do Estado, que por oportuno dizer, sempre demonstrou dificuldade em cumprir sua função, justifica a transferência de competências típicas do primeiro setor, para uma nova esfera, a das organizações da sociedade civil, ou seja, o terceiro setor.
Marçal Justen Filho (2014) considera que as Organizações colaboradoras, normalmente desenvolvem serviços que derivam das políticas públicas das áreas da saúde, educação e assistência social, oferendo suporte onde o estado não consegue chegar ou complementando os serviços já oferecidos.
Com o intuito de obtenção de maior presteza, flexibilidade e eficiência, é que o Estado desenvolve parcerias com o Terceiro Setor, que oferece serviços públicos de forma mais rápida e eficiente, sem dar tanta ênfase nos atos e nos procedimentos que a Administração Pública tem por imposição legal observar, com isso ocorre à desburocratização na prestação de serviços de interesse público, com um regime mais flexível e mais dinâmico. Porém, isso não quer dizer que as organizações parceiras não devem observar os princípios constitucionais que regem a Administração Pública na execução de suas finalidades estatutárias, os quais sejam os princípios, da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência.
A natureza jurídica das parcerias entre a Administração Pública e o Terceiro Setor está embasada na cooperação mútua, ou seja, os partícipes buscam a mesma finalidade para o ajuste: o desenvolvimento de serviços públicos de interesse e de necessidade da coletividade.
As organizações da sociedade civil, quando celebram parcerias coma a Administração Pública, passam a ter caráter hibrida, pois, tendo regime jurídico de direito privado, desempenham função pública, porém não fazem parte da Administração Pública.
As Organizações da Sociedade Civil podem ou não, formalizarem parcerias com o poder público, porém optando pelo sim, deverão se sujeitar as normativas e ao controle da Administração Pública e Tribunais de Contas.
3 Previsão constitucional da participação do terceiro setor nos principais serviços de interesse público
A base legal no ordenamento jurídico brasileiro, para a participação do terceiro setor na realização e oferecimento dos serviços de interesse público em colaboração com o Estado, está contida expressamente na Constituição da República de 1988, onde se configura o reconhecimento da importância e a confiabilidade dessa colaboração/participação para o desenvolvimento das políticas públicas.
A Constituição da República prevê situações em que os serviços públicos poderão ser prestados de forma indireta, com a colaboração de particulares.
Em relação à saúde, a previsão está contida primeiramente, no artigo 197:
Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também por pessoa física e jurídica de direito privado. (grifo nosso).
Para complementar o entendimento dos legisladores em relação aos particulares colaboradores e afirmar a visão dos mesmos, em relação a certeza da competência e condições de organização do terceiro setor em ofertar serviços públicos de qualidade aos que deles necessitarem, expressou sua preferência no artigo 199, §1° de nossa Carta Magna:
Art. 199. A assistência à saúde é livre a iniciativa privada.
§1º As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência às entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos. (grifo nosso).
E assim acontece com outros serviços públicos de grande relevância, com as políticas da área da educação e assistência social.
O artigo 204 prevê como serão realizadas as ações governamentais na área de assistência social, deixando bem clara, serem as organizações do terceiro setor a fonte indireta de prestação dessas ações:
Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes:
I - descentralização político-administrativa, cabendo à coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social; (grifo nosso).
Quanto ao expresso, fica a cargo dos Estados e Municípios e execução das ações em assistências sociais, o que se entendi uma preocupação dos legisladores, para que as ações sejam executadas por quem possui o contato direto com a população necessitada, o que inclui as organizações do terceiro setor locais, para favorecer a interação entre os indivíduos receptores, criando espaço para a criação de vínculos, para a reflexão, troca de experiências e busca de soluções para os problemas comuns, estimulando a solidariedade e a cidadania.
Na execução das políticas públicas voltadas para a educação, não seria diferente, a Constituição estabelece em seu artigo 205, que a educação é direito de todos, e uma inovação que merece comento, coloca a família como coautora, juntamente com o Estado e a Sociedade, na divisão da obrigatoriedade do incentivo e oferecimento de educação de qualidade.
art. 205 A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (grifo nosso).
Para elucidar de forma mais clara, onde se encaixa a participação e a importância do terceiro setor, também para essa área de serviços púbicos, expressa o artigo 2013 e incisos:
Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que: (grifo nosso).
I - comprovem finalidade não-lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação;
II - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades.
Todas as políticas públicas citadas na explanação acima estão previstas no título Da Ordem Social, e por não serem de titularidade exclusiva do Estado comportam atuação simultânea do particular, dentre as organizações privadas autorizadas, e com ares de preferência, estão as do terceiro setor.
Todavia, de nenhuma forma, o Estado deve transferir toda a responsabilidade dessa prestação de serviço aos particulares, nem mesmo ao terceiro setor, essas iniciativas de parcerias devem ser utilizadas para unir esforços em prol da coletividade e não eximir do Estado de suas responsabilidades. Independente do particular que executar serviços públicos, estes sempre serão prestado sob a tutela do Estado, por meio de mecanismos de apoio e fiscalização.
4 As organizações do terceiro setor
Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2014), as organizações do Terceiro, embora se diferencie por suas particularidades, instituídas por seus estatutos ou mesmo por força de lei, possui características que são comuns a todas elas. Vejamos algumas: Não são criadas pelo Estado, mas são formalmente constituídas, para assegurar a permanência de suas atividades, por tempo determinado, ou até mesmo indeterminado; Em regra, desempenham em colaboração com o Estado atividade privada de interesse público, sendo este o nome que se dá, quando os serviços públicos são prestados a coletividade pelos particulares; Todas, preenchendo os requisitos legais, podem ter vínculo jurídico com o Estado, por meio de termo de fomento, termo de colaboração, acordo de cooperação, termo de parceria, contrato de gestão, convênios e outros instrumentos congêneres; O regime jurídico é o de direito privado, embora possa ocorrer sua supressão por normas do direito público, em função, justamente do vínculo que as ligam ao Poder Público, quando da formalizadas de parcerias; e todas integram o terceiro setor, pois não se enquadram inteiramente como associações privadas por seu caráter hibrido, nem integram a Administração Pública, todas são organizações privadas não governamentais.
Passaremos a análise das particularidades que envolvem cada organização do terceiro setor, por força das leis que as embasam:
4.1 Organizações sociais
As organizações sociais não nascem com essa denominação, são constituídas sob a forma de associação, e posteriormente se habilitam, cumprindo a exigências legais para a matéria, perante o Poder Público, do qual recebe uma qualificação, que se trata de título jurídico, concedido e quando não cumprido os ditames legais para a sua permanência, são cancelados pelo Poder Público.
São várias as definições e conceitos doutrinários a respeito de organizações sociais, vejamos alguns deles:
Organização social é uma associação civil ou fundação que, em virtude do preenchimento de requisitos legais, é submetida a um regime jurídico especial, que contempla benefícios especiais do Estado para a execução de determinadas atividades do interesse coletivo. (Marçal Justen Filho, 2014, p. 333).
Organização social é a qualificação jurídica dada a pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, instituída por iniciativa de particulares, e que recebe delegação do Poder Público, mediante contrato de gestão, para desempenhar serviço público de natureza social. (Maria Sylvia Zanella Di Pietro, 2014, p. 580).
Essas pessoas, a quem incumbirá a execução de serviços públicos em regime de parceria com o Poder Público, formalizado por contrato de gestão, constituem as organizações sociais. (José dos Santos Carvalho Filho, 2018, 438).
Os requisitos legais que deverão ser preenchidos por uma associação que possua a pretensão de se qualificar como organização social estão elencados no art. 2º da Lei Federal nº 9.637 de 15 de maio de 1998, sendo alguns deles: Compatibilidade de sua finalidade estatutária, com a área de atuação do serviço público que irá realizar; não possuir fins lucrativos, e ter por obrigação o investimento de seus excedentes, no desenvolvimento de suas atividades estatutárias; possuir como órgão de deliberação superior, Conselho de Administração composto por representantes do Poder Público, membros da sociedade civil de notória capacidade profissional e idoneidade moral, e uma diretoria, ambos definidos nos termos do Estatuto, assegurados, composição e atribuições normativas e de controle previstas na Lei Federal nº 9.637/98; obrigatoriedade de publicação em jornais oficiais e de grande circulação de seus relatórios financeiros e de execução, assim como, se tratando de associações, aceitação de novos associados, nos moldes de seu estatuto; proibição de distribuição, a qualquer pretexto, de bens e do patrimônio líquido a associado ou membro da entidade; e previsão, em caso de extinção ou desqualificação, que o patrimônio integral, bem como os excedentes financeiros em função de suas atividades, será destinado a outra organização social, com qualificação no mesmo ente federativo, da mesma área de atuação, e não havendo essa possibilidade, ao próprio ente federativo, porém nesse caso na proporção dos recursos e bens por estes alocados. (art. 2º da lei 9.637/1998).
O Poder público poderá qualificar as associações privadas, cujas atividades desempenhadas sejam voltadas, para as áreas do ensino, pesquisas científicas, desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde.
A Lei Federal nº 9.637/98 é de observância obrigatória apenas para a União e serviços públicos federais, porém não há impedimento que os Estados, Distrito Federal e Municípios, legislem suas próprias leis, para tanto, podem seguir o modelo da lei federal, ou modelo diverso, desde idênticos sejam seus objetivos e requisitos.
4.1.2 Contrato de gestão
No entendimento de Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco (2018), o contrato de gestão é o vínculo instituído entre o Estado e a organização social, para a formalização da parceria, e discriminarão as atribuições, obrigações e responsabilidades do Poder Público e da organização social.
Como em todos os instrumentos formalizados pelo Poder Público, o contrato de gestão, também se fará observar os princípios constitucionais da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e economicidade, e devem ainda observar, as especificações do plano de trabalho, os prazos de execução das atividades e metas a serem alcançadas e o método de avaliação do desempenho e produtividade (art.7º da Lei 9.637/1998).
No entendimento do doutrinador José dos Santos Carvalho Filho (2018), caso haja, dispêndio de recursos públicos para a execução do objeto do contrato de gestão, caberá ao ente federativo, por força da lei, a fiscalização das atividades, bem como o exame da prestação de contas da organização social, onde qualquer irregularidade deve ser imediatamente comunicada ao Tribunal de Contas, sob pena de responsabilização do agente fiscalizador.
As organizações sociais serão desqualificadas, quando for constatado o descumprimento das disposições contidas no contrato de gestão, o que e será realizado por procedimento administrativo, assegurado o princípio fundamental do contraditório e ampla defesa, sendo responsabilizados os dirigentes da organização social, pelos danos caudados por suas ações ou omissões, e ainda, a desqualificação acarretará, na reversão dos bens públicos cedidos e dos valores repassados e malversados pelas organizações sociais, sem prejuízo de outras sanções por lei cabíveis (José dos Santos Carvalho Filho, 218).
4.2 Organizações da sociedade civil de interesse público
Em semelhança com as organizações sociais, nenhuma associação privada nasce organização da sociedade civil de interesse público, para tanto, necessário se faz, o recebimento de uma qualificação, para fazer jus ao título.
Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, define organização da sociedade civil de interesse público como (2014, p.584):
Trata-se de qualificação jurídica dada as pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, instituídas por inciativa de particulares, para desempenhar serviços sociais não exclusivos com incentivo e fiscalização pelo Poder Público.
A legislação que regulamenta essa espécie de organização da sociedade civil é a Lei Federal nº 9.790 de 23 de março de 1999, regulamentada pelo Decreto nº 3.100 de 30 de junho de 1999.
A primeira disposição da citada lei federal, está relacionada com a definição do que são associações sem fins lucrativos, assim consideradas por força de lei, a pessoa jurídica de direito privado que não distribui, entre os seus sócios ou associados, conselheiros, diretores, empregados ou doadores, eventuais excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos, bonificações, participações ou parcelas do seu patrimônio, auferidos mediante o exercício de suas atividades, e que os aplica integralmente na consecução do respectivo objeto social.(art. 1º, § 1º da lei 9.790/1999).
Há algumas vedações para a aplicabilidade legal de qualificação como organização da sociedade civil de interesse público, independente área de atuação, a lei 9.790/99 são se aplica: As sociedades comerciais; os sindicatos; as associações de classe ou de representação de categoria profissional; as instituições religiosas; as organizações partidárias e assemelhadas, inclusive suas fundações; as entidades de benefício mútuo destinadas a proporcionar bens ou serviços a um círculo restrito de associados ou sócios; as entidades e empresas que comercializam planos de saúde e assemelhados; as instituições hospitalares privadas não gratuitas e suas mantenedoras; as escolas privadas dedicadas ao ensino formal não gratuito e suas mantenedoras; as organizações sociais; as cooperativas; as fundações públicas; as fundações, sociedades civis ou associações de direito privado criadas por órgão público ou por fundações públicas; e organizações creditícias que tenham quaisquer tipos de vinculação com o sistema financeiro nacional. (art. 2º da lei 9.790/1999).
As associações privadas que pretenda a qualificação como organização da sociedade civil de interesse público, deverá solicitar essa titulação, preenchendo os requisitos legais, perante o Ministério da Justiça, e deve atuar em pelo uma das seguintes áreas: Assistência social; promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; promoção gratuita da educação e da saúde; promoção da segurança alimentar e nutricional; da defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável; promoção do voluntariado; promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza; experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócios produtivos e de sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito; promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar; promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros valores universais; e estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científico e estudos e pesquisas para o desenvolvimento, a disponibilização e implementação de tecnologias voltadas à mobilidade de pessoas, por qualquer meio de transporte. (art. 3º da lei 9.790/1999).
O estatuto social das associações privadas que pretendam a qualificação como organização sociedade civil de interesse público, deverá conter expressamente: A observância na execução de suas atividades dos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e eficiência; a adoção de boas e práticas administrativas, para evitar situações de benefícios pessoais indevidos, em decorrência do poder decisório; constituição de conselho fiscal ou órgão equivalente; previsão de que, em caso de dissolução, da associação, o seu patrimônio será transferido à outra pessoa jurídica com finalidade estatutária congênere e que possua a qualificação idêntica; previsão, em caso de perda da qualificação, o acervo patrimonial, adquirido com recursos públicos, resultantes de parcerias instituídas, seja transferido a outra pessoa jurídica com qualificação idêntica; possibilidade de remuneração dos dirigentes e daqueles que prestam serviços específicos, respeitando os valores praticados no mercado na área de atuação profissional; prestações de contas deverão conter no mínimo: Observância dos princípios e normas da contabilidade brasileira; a publicidade dos relatórios de atividade e das demonstrações financeiras, incluindo as certidões negativas de débitos; realizações de auditorias internas e externas dos recursos públicos oriundos de parcerias e prestação de contas de todos os recursos públicos recebidos (art. 4º da lei 9.790/1999).
Tais exigências demonstram que a qualificação como organização da sociedade civil de interesse público, implica em sérias responsabilidades, para associação em colaborar no desempenho de serviços públicos com o Estado e nota-se a grande estrutura material e jurídica por parte das interessadas em conseguir a citada qualificação em função da seriedade exigida para a matéria.
A lei federal nº 9.790/99 é de observância obrigatória apenas para a União, não tendo aplicabilidade obrigatória nas esferas estaduais e municipais, porém não há impedimento que os Estados, Distrito Federal e Municípios, legislem suas próprias leis, que não necessitam serem os ditames, idênticos aos da lei federal, contanto que não sejam divergentes seus objetivos.
4.2.1 Termo de parceria
Termo de parceria é a nomenclatura dada aos instrumentos jurídicos, formalizados entre as organizações da sociedade civil de interesse público com o Poder Público, com o intuito de regulamentar a execução das atividades de interesse público pactuadas.
Os termos de parcerias deverão conter cláusulas essenciais que especifique as responsabilidades e obrigações das partes; o objeto da parceria em acordo com o plano de trabalho apresentado pela organização da sociedade civil de interesse público; o estabelecimento de metas, resultados a serem atingidos e os prazos para a execução; critérios objetivos de avaliação de desempenho a serem utilizados; previsão de receitas e despesas a serem realizadas no cumprimento do objeto pactuado e o detalhamento dos valores a serem pagos aos dirigentes, empregados e consultores com recursos oriundos da parceria formalizada; estipular a obrigatoriedade de apresentação de prestação de contas ao Poder Público parceiro contendo: Comparativo de metas propostas com os resultados alcançados, acompanhados dos comprovantes dos gastos efetivamente realizados; a obrigatoriedade de publicação do extrato do termo de parceria e demonstrativos de sua execução física e financeira (art. 10, §2º da lei 9.790/1999).
Um detalhe muito importante a ser observado por todas as esferas governamentais está na obrigatoriedade legal de preceder a consulta nos conselhos de políticas públicas da área de interesse, antes da formalização de termos de parceria, cabendo posteriormente à formalização, à fiscalização da parceria, ao órgão público firmador e ao respectivo conselho da política pública (§ 1º do art. 10 da Lei 9.790/1999).
Os responsáveis pela fiscalização da parceria, ao se certificarem de qualquer irregularidade ou ilegalidade envolvendo a malversação de bens e recursos públicos por parte da organização parceira, deverão imediatamente cientificar o Tribunal de Contas e ao Ministério Público respectivo, 0sob pena de responsabilidade solidária (art. 12 da lei 9.790/1999).
4.3 Organização da sociedade civil
A definição do que são organizações da sociedade civil se divide em três categorias com fundamento contido no artigo 2º da lei federal nº 13.019 de 31 de julho de 2014, aletrada pela lei federal nº 13.204 de 14 de dezembro de 2015, hoje conhecida nacionalmente como marco regulatório das OSCs.
Art. 2º Para os fins desta Lei considera-se:
I - organização da sociedade civil:
a) Entidade privada sem fins lucrativos que não distribua entre os seus sócios ou associados, conselheiros, diretores, empregados, doadores ou terceiros eventuais resultados, sobras, excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos, isenções de qualquer natureza, participações ou parcelas do seu patrimônio, auferidos mediante o exercício de suas atividades, e que os apliques integralmente na consecução do respectivo objeto social, de forma imediata ou por meio da constituição de fundo patrimonial ou fundo de reserva;
b) As sociedades cooperativas previstas na Lei nº 9.867, de 10 de novembro de 1999; as integradas por pessoas em situação de risco ou vulnerabilidade pessoal ou social; as alcançadas por programas e ações de combate à pobreza e de geração de trabalho e renda; as voltadas para fomento, educação e capacitação de trabalhadores rurais ou capacitação de agentes de assistência técnica e extensão rural; e as capacitadas para execução de atividades ou de projetos de interesse público e de cunho social.
c) as organizações religiosas que se dediquem a atividades ou a projetos de interesse público e de cunho social distintas das destinadas a fins exclusivamente religiosos;
Pelas categorias definidas como organizações da sociedade civil, verifica tratar-se de categoria jurídica genérica, caso em se incluem diversos entes de categorias específicas, como acontece com as organizações sociais e organizações da sociedade civil de interesse público, que nada mais são do que organização da sociedade civil que receberam qualificações por preencherem os requisitos legais instituídos por lei especifica. Por via de consequência, todas as organizações sociais e organizações da sociedade civil de interesse público são organizações da sociedade civil, mas nem toda organização da sociedade civil ostentam alguma qualificação (José dos Santos Carvalho Filho, 2018).
As exigências contidas no marco regulatório das OSCs, não estendem a suas exigências a vários ajustes e normas, os quais podem citar: às transferências de recursos homologadas pelo Congresso Nacional ou autorizadas pelo Senado Federal naquilo em que as disposições específicas dos tratados, acordos e convenções internacionais conflitarem com esta Lei; aos contratos de gestão celebrados com organizações sociais; aos convênios e contratos celebrados com entidades filantrópicas e sem fins lucrativos na área da saúde; aos termos de compromisso cultural; aos termos de parceria celebrados com organizações da sociedade civil de interesse público; aos pagamentos realizados a título de anuidades, contribuições ou taxas associativas em favor de organismos internacionais ou entidades que sejam obrigatoriamente constituídas por: membros de Poder ou do Ministério Público; dirigentes de órgão ou de entidade da administração pública; pessoas jurídicas de direito público interno; pessoas jurídicas integrantes da administração pública; e às parcerias entre a administração pública e os serviços sociais autônomos (art. 3º da lei 13.019/2014).
Segundo o art. 2º, inciso III, da lei 13.019/2014, as parcerias entre as organizações da sociedade civil e o Poder Público podem ser conceituadas como o conjunto de direitos, responsabilidades e obrigações decorrentes de relação jurídica estabelecida formalmente entre a administração pública e organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, mediante a execução de atividade ou de projeto expressos em termos de colaboração, em termos de fomento ou em acordos de cooperação.
Termos de colaboração e termos de fomentos possuem praticamente a mesma definição legal, ambos são o instrumento jurídico por meio do qual se estabelece parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil pela consecução de finalidade pública e reciproca que envolva transferência de recursos financeiros. O diferencial consiste que, no termo de colaboração o objeto a ser desenvolvido será proposto pela administração pública e no termo de fomento será proposto pela organização da sociedade civil (art. 2º, VII e VIII da lei 13.019/2014).
Os acordos de cooperação, apesar de também possuir praticamente a mesma definição legal, possuem uma particularidade especial, somente será utilizado para instituir parcerias que não contemplem a transferência de recursos financeiros (art.2º VIII-A da lei 13.019/2014).
Para celebrarem parcerias com a administração pública, a lei exige que as organizações da sociedade civil possuam organização interna (Estatuto) que prevejam expressamente: objetivos voltados à promoção de atividades e finalidades de relevância pública e social; em caso de dissolução da organização, o respectivo patrimônio líquido seja transferido à outra pessoa jurídica de natureza congênere e que preencha os requisitos legais e cuja finalidade estatutária seja, preferencialmente, o mesmo da organização extinta; escrituração de acordo com os princípios e Normas Brasileiras de Contabilidade; possuam no mínimo um ano para os Município, dois anos para os Estados e Distrito Federal e três anos para a União, de cadastro ativo, com base no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ, podendo os prazos serem reduzidos por ato específico de cada ente, na hipótese de nenhuma organização atingi-los; que tenham experiência prévia comprovada na realização, com efetividade, do objeto da parceria ou de natureza semelhante; finalizando, que possuam capacidade técnica, física e operacional para o cumprimento dos objeto pactuado e das metas estabelecidas (art. 33 da lei 13.019/2014).
O preenchimento de tantos e rigorosos requisitos legais, tem por finalidade o afastamento de organizações fraudulentas, constituídas por membros desonestos que buscam apenas o enriquecimento ilícito e a satisfação de interesses obscuros, à custa da exploração dos recursos públicos.
Assim como há necessidade de do preenchimento de requisitos, a lei também expressa sobre a vedação na formalização de parceria que envolvam ou incluam em seu objeto delegação de atividades que sejam exclusivas do Estado como por exemplo, pode citar as funções de regulação, de fiscalização e o exercício do poder de polícia. Esses por serem serviços próprios do Estado são impossibilitados de delegação para as organizações privadas, que não possuem as prerrogativas típicas de autoridade (art.40 da lei 13.019/2014).
A forma de seleção das organizações da sociedade civil, para a formalização de parcerias com o poder público, se realiza por meio de chamamento público, podendo ser definido como, procedimento destinado a selecionar organização da sociedade civil para firmar parceria, no qual se garanta a observância dos princípios da isonomia, da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos. (art. 2º, inciso XII, da lei 13.019/2014).
O procedimento do chamamento público deverá conter elementos claros, objetivos e simplificados, que facilite o acesso de maior número possível de organizações interessadas. Para tanto, a Administração Pública, deve estabelecer critérios específicos e passíveis de avaliação, principalmente em relação ao objeto, as metas, aos custos e a avaliação dos resultados tanto quantitativamente, quanto qualitativamente.
O chamamento público será iniciado com publicação de um edital, onde devem ser especificados, alguns itens necessários: a programação orçamentária que viabiliza a parceria; o objeto da parceria; os elementos facilitadores para apresentação das propostas (datas, prazos, local, etc.); os critérios de seleção, sobretudo no que toca à metodologia de pontuação e ao peso atribuído a cada critério; o valor calculado para a consecução do objeto; condições para interposições de recurso na esfera administrativa, a minuta instrumento da parceria; e de acordo com as especificações do edital, medidas de acessibilidade que garanta a participação de pessoas com mobilidade reduzida. (art. 24, § 1º, da lei 13.019/2014).
O edital deverá ser elaborado de maneira que, não conste nenhuma cláusula ou condição que comprometa, restrinja ou frustre o caráter competitivo do certame, do qual tem como finalidade, a obtenção de excelente parceiro privado que ofereça a melhor prestação de serviço possível para o público-alvo receptor. Contudo, a lei admite duas exceções que são: a) propostas apresentadas exclusivamente por organizações sediadas no local onde será executado o objeto da parceria e b) delimitação do território ou abrangência da prestação de atividades ou execução de projetos. (art. 24, § 2º, da lei 13.019/2014).
O chamamento público se assemelha muito as modalidades de licitação pública, e como as mesmas, também possuem casos onde o procedimento seletivo poderá ser dispensado ou inexigível. Em alguns casos de em que o gestor público poderá por discricionariedade, ou seja, analisando a conveniência e oportunidade, dispensar o procedimento de chamamento público é: no caso de urgência decorrente de paralisação ou iminência de paralisação de atividades de relevante interesse público, porém não por tempo indeterminado a lei estabelece o prazo máximo de cento e oitenta dias, por caracterizar este, prazo suficiente para a normalização das atividades; nos casos de guerra, calamidade pública, grave perturbação da ordem pública ou ameaça à paz social; quando se tratar da realização de programa de proteção a pessoas ameaçadas ou em situação que possa comprometer a sua segurança; no caso de atividades voltadas ou vinculadas a serviços de educação, saúde e assistência social, desde que executadas por organizações da sociedade civil, previamente credenciadas pelo órgão gestor da respectiva política; no caso de recursos decorrentes de emendas parlamentares às leis orçamentárias anuais. (art. 29 e 30 da lei 13.019/2014).
Já a questão da inexigibilidade se caracteriza com a inviabilidade ou impossibilidade de competição entre as organizações da sociedade civil, portanto inexiste a finalidade do chamamento público que é possibilidade de competição entre organizações interessadas que preencham os requisitos, no caso em tela, a lei considerada o chamamento público inexigível quando: o objeto da parceria é de natureza singular e somente possa ser desenvolvido por uma única organização; quando as metas somente podem ser alcançadas por determinada organização; o objeto da parceria constituir incumbência prevista em acordo, ato ou compromisso internacional, no qual sejam indicadas as instituições que utilizarão os recursos; a parceria decorrer de transferência para organização da sociedade civil que esteja autorizada em lei na qual seja identificada expressamente a organização beneficiária (art.31, da lei 13.019/2014).
Importante salientar que os casos de dispensa e inexigibilidade são para o procedimento de chamamento público, e não para os demais ditames da lei 13.019/2014, todos os demais institutos previstos deverão ser observados, tanto para a formalização quanto a prestação de contas das parcerias com as organizações da sociedade civil.
Outro assunto de grande relevância para o sucesso das parcerias está relacionado a prestação de contas dos recursos recebidos, a obrigatoriedade, antes de constar em leis ordinárias, já é matéria constante de carta mãe de todas as leis, a Constituição da República, em seu artigo 70, parágrafo único, in verbis:
Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998).
Com essa ilustre previsão legal, é indiscutível a obrigatoriedade da organização parceira em prestar contas dos recursos recebidos e gerenciados, e principalmente impõe a obrigatoriedade do Poder Público em exigir essa prestação.
A administração pública deverá fornecer manuais explicativos que facilite para as organizações parceiras o procedimento da prestação de contas, como grande auxiliar nesta tarefa, está os Tribunais de Contas dos Estados que emitem instruções procedimentais claras e objetivas para orientar os órgãos públicos, como exemplo pode ser citado o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, que possui vigente a Instrução 002/2016, que estabelece normativas para formalização e prestação de contas de parcerias, por meio de termos de fomento/colaboração, termos de parcerias, contratos de gestão, etc. Portanto, se torna uma cadeia, onde os Tribunais de Contas fiscalizam os órgãos públicos e os órgãos públicos fiscalizam as organizações parceiras, ou deveria ser assim.
As prestações de contas deverão conter documentações que possibilitem ao gestor público realizar o acompanhamento e a avaliação das metas pactuadas e dos resultados alcançados em acordo com o estabelecido em plano de trabalho ou proposta técnica.
Para facilitar o acompanhamento e a supervisão das parcerias pelos gestores públicos a lei estabelece alguns documentos que devem ser solicitados: a) relatório de atividades com descrição pormenorizada; b) relatório da execução do objeto, contendo as atividades ou projetos desenvolvidos para o cumprimento do objeto e o comparativo de metas propostas com os resultados alcançados; e c) relatório de execução financeira do termo de colaboração ou do termo de fomento, com a descrição das despesas e receitas efetivamente realizadas e sua vinculação com a execução do objeto (art. 66 da lei 13.019/2014).
Para complementar essa fiscalização cabe à administração pública se for, o caso, a realização de visita in loco na sede da organização parceria e a posterior edição de relatório técnico de avaliação e monitoramento, homologado por comissão designada para essa finalidade.
O gestor público munido de toda pertinente documentação manifestará pela conclusão da prestação de contas que poderá ser avaliada em: a) regulares, quando expressarem, de forma clara e objetiva, o cumprimento dos objetivos e metas estabelecidos no plano de trabalho; b) regulares com ressalva, quando evidenciarem falta de natureza formal que não resulte em danos ao erário; e c) irregulares, quando comprovada a omissão no dever de prestar contas, o descumprimento injustificado dos objetivos e metas estabelecidos no plano de trabalho, danos ao erário público e desfalque ou desvio de dinheiro, bens ou valores públicos (art. 72, inciso I ao III, da lei 13019/2014).
Para não cumprimento desta obrigação, são previstas sanções que poderão ser aplicadas pela administração pública, garantindo o contraditório e a ampla defesa à organização parceira: a) advertência; b) suspensão temporária da participação em chamamento público e impedimento de celebrar parceria ou contrato com órgãos e entidades da esfera de governo da administração pública sancionadora, por prazo não superior a dois anos; c) declaração de inidoneidade para participar de chamamento público ou celebrar parceria ou contrato com órgãos e entidades de todas as esferas de governo, enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a autoridade sancionadora, que será concedida sempre que a organização da sociedade civil ressarcir a administração pública pelos prejuízos resultantes e depois de decorrido o prazo de dois anos (art. 73, incisos I ao III, da lei 13.019/2014).
5 Conclusão
Diante da apresentação de todo o estudo realizado que procurou esclarecer toda a dinâmica legal e a estrutura administrativa que possui o terceiro setor e a grande colaboração na prestação de serviços de interesse público, que desenvolve ao lado do Estado.
A estrutura legal que deve possuir uma organização para ser caracterizada como terceiro setor é muito grande, e somente veio a se fortalecer com o advindo do marco regulatório das organizações da sociedade civil (lei 13.019/2014), que passou a regulamentar todas as espécies de organizações de forma residual, obrigando-as a possuir capacidade física, técnica e operacional para o desenvolvimento das parcerias com o Estado.
A praticarem a leitura desse trabalho, algumas pessoas podem vir a acreditar, de forma equivocada, que tanta formalização jurídica e administrativa pode acarretar na diminuição das oportunidades de parcerias e como consequência um alcance menor de pessoas beneficiadas com os serviços, contudo deve ser o entendimento que o intuito do Estado é prestar serviços com o máximo de qualidade possível, e para isso necessita de parceiros com relevante capacidade para o seu desenvolvimento,
Outro ponto de suma importância a se considerar é que o próprio Estado legislou criando mecanismo defesa para si, o que resultou na seleção natural das organizações, para evitar formalizar parcerias com organizações picaretas e que farão malversação dos recursos públicos, quanto mais burocrático for, menos organizações inidôneas sobreviverão.
As legislações que versam disciplinando o setor estudado possibilitam ao Estado o acompanhamento, o controle e a fiscalização das parcerias, como maneira de desempenhar sua função de cuidado e utilização correta dos tributos impostos à população.
O Estado possui uma grande ferramenta nas mãos, que se bem utilizada, fará a grande diferença nos serviços de ordem social que deve oferecer a população, cabendo a ele a sabedoria de se utilizar dessa conveniência para transferir os encargos da prestação dos serviços a outras pessoas jurídicas, nunca abdicando, porém do dever de controle e fiscalização sobre elas, pois quando uma parceria não apresenta o resultado esperado, o Estado falhou em uma de suas competências, ou não exerceu um controle rígido na seleção da parceira ou não fiscalizou o objeto pactuado.
REFERÊNCIAS
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CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual do Direito Administrativo. 32ª Edição. São Paulo: Atlas, 2018.
MENDES, Gilmar Ferreira; GONET BRANCO, Paulo Gustavo. Curso de Direito Constitucional. 13ª Edição. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
ZANELLA DI PIETRO, Maria Sylvia. Direito Administrativo. 27ª Edição. São Paulo: Atlas S.A., 2014.
FILHO, Marçal Justen, Curso de Direito Administrativo. 10ª Edição. São Paulo. Revistas dos Tribunais LTDA. 2014.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil.1989. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
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BRASIL. Lei nº 9.790 de 23 de março de 1999. Dispõe sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, institui e disciplina o Termo de Parceria, e dá outras providências. 1999. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9790.htm
BRASIL. Lei nº 13.019 de 31 de julho de 2014. Estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, mediante a execução de atividades ou de projetos previamente estabelecidos em planos de trabalho inseridos em termos de colaboração, em termos de fomento ou em acordos de cooperação; define diretrizes para a política de fomento, de colaboração e de cooperação com organizações da sociedade civil; e altera as Leis nºs 8.429, de 2 de junho de 1992, e 9.790, de 23 de março de 1999. 2014. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13019.htm
[1] Docente professora mestra do curso de Direito – IESB Instituto de Ensino Superior de Bauru.
Aluna do Curso de Direito no Instituto de Ensino Superior de Bauru - IESB.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PEREIRA, Roseli Ferreira. O Terceiro Setor ao lado do Estado Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jun 2020, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54780/o-terceiro-setor-ao-lado-do-estado. Acesso em: 22 nov 2024.
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