RESUMO: O presente trabalho tem como propósito, o conhecimento acerca do tema jornada de trabalho dos servidores públicos federais, da carreira do Seguro Social, a fim de verificar a possibilidade do direito ao pagamento do adicional de serviço extraordinário ou da compensação da jornada. O Instituto Nacional do Seguro Social por meio da Instrução Normativa nº 76/2014, vedou essa possibilidade violando o texto constitucional e legal, sendo seus dispositivos ao criar uma verdadeira inovação normativa ao extrapolar o poder regulamentar, violar o princípio da legalidade (art. 37, caput da CF) e competência legislativa, inconstitucional e ilegal.
Palavras-chave: Inconstitucionalidade e ilegalidade da Instrução Normativa. Horas extras. Adicional de serviço extraordinário.
ABSTRACT: El presente trabajo tiene como propósito, el conocimiento acerca del tema del jornada de trabajo de los funcionarios públicos federales, de la carrera del Seguro Social, a fin de comprobar la posibilidad del derecho al pago del adicional de servicio extraordinario o de la compensación de la jornada. El Instituto Nacional del Seguro Social por medio de la Instrucción Normativa nº 76/2014, vedó esa posibilidad violando el texto constitucional y legal, siendo su disposición al crear una verdadera innovación normativa al extrapolar el poder reglamentario, violar el principio de legalidad (artículo 37 , caput de la CF) y competencia legislativa, inconstitucional e ilegal.
Keywords: Ilegalidad de la Instrucción Normativa. Hora extra. Derecho a la percepción de adicional por servicio extraordinario.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho científico terá por finalidade, estudar o tema jornada extraordinária, servidores federais, cargos da carreira do Seguro Social. Os detentores desses cargos, são impedidos de prestarem trabalho além da jornada normal de 08 horas diárias e 40 semanais, e de 06 horas diárias e 30 semanais, ao servidor com jornada especial.
Assim sendo, o presente artigo será dividido em 02 (dois) capítulos. No primeiro capítulo se observará quanto, a jornada de trabalho dos servidores públicos federais, carreira do Seguro Social, no que se refere a possibilidade de banco de horas e adicional de serviço extraordinário. O segundo capítulo da inconstitucionalidade e ilegalidade da instrução normativa nº 76/2014/INSS, versando quanto a sua incompatibilidade ao texto constitucional e legal, ao vedar a possibilidade “banco de horas”.
Para alcançar o desiderato científico proposto, será utilizada a metodologia as fontes primárias, os textos das normas legais; e como fontes secundárias as decisões judiciais, as jurisprudências, e as doutrinas, concernem ao tema proposto. Estas últimas para elaboração e entendimento daquelas primeiras. Ou seja, a utilização dos conteúdos normativos estudados pela doutrina e pela jurisprudência para, com isso, desenvolver e aprofundar o estudo.
Por fim, o objeto deste trabalho científico voltará em verificar a importância temática da jornada extraordinária dos servidores públicos, cargos da carreira do Seguro Social, em razão da inexistência de trabalhos científicos com o mesmo tema proposto.
1 JORNADA DE TRABALHO DOS SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS, CARREIRA DO SEGURO SOCIAL
A Constituição do Brasil de 1988, ao estabelecer no capítulo “Dos Direitos Sociais” traz regras e princípios, explícitos ou decorrentes implicitamente, desta, que aplicam-se aos trabalhadores em geral, irradiando-se para todo o sistema.
No que concerne ao tratamento isonômico dos trabalhadores em geral, a Carta Magna, em seu artigo 7º, dispõe os direitos e garantias, os quais são assegurados, a todos os trabalhadores, é fruto da irradiação sistêmica do princípio da igualdade fincado no inciso I, do artigo 5º.
A Carta Magna, em seu § 3º do artigo 39, abrange também os servidores públicos ocupantes de cargo público, as garantias concedidas aos trabalhadores celetistas, dentre elas o de “banco de horas” e o adicional de serviço extraordinário com o acréscimo pecuniário de mínimo em cinquenta por cento à hora normal, a redução da jornada mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho, ao prevê que os direitos previstos no art. 7º IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, in verbis:
“Art. 39 A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.
[…]
§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.” (grifo nosso)
Nesse sentido, ensina José Afonso da Silva (2014, p. 711), que "A declaração dos direitos e garantias dos servidores públicos civis completa-se com a disposição do art. 39, § 3º, que manda aplicar a eles vários direitos sociais previstos no art. 7º, para os trabalhadores rurais e urbanos […].”
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal (STF) ao julgar Agravo Regimental no Agravo Instrumento (AI nº 642528) entendeu que pela aplicabilidade do direito do trabalho, previsto na Constituição Federal da República do Brasil, no artigo 7º, inciso XVI, tem aplicabilidade imediata aos servidores públicos, em razão de sua autoaplicabilidade, por seu próprio teor não carece de qualquer complementação legal, in verbis:
“EMENTA Agravo regimental no agravo de instrumento. Servidor público. Pagamento de serviço extraordinário. Artigo 7º, inciso XVI, da Constituição Federal. Autoaplicabilidade. 1. O art. 7º, inciso XVI, da Constituição Federal, que cuida do direito dos trabalhadores urbanos e rurais à remuneração pelo serviço extraordinário com acréscimo de, no mínimo, 50%, aplica-se imediatamente aos servidores públicos, por consistir em norma autoaplicável. 2. Agravo regimental não provido. (AI 642528 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 25/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-201 DIVULG 11-10-2012 PUBLIC 15-10-2012).”
No entanto, há posição em sentido diverso, quanto ao pagamento do adicional do serviço extraordinário, o STF ao julgar o Agravo em Recurso Extraordinário (722628/MG), manifestou pela legalidade de compensação de horas excedentes com concessão de folgas, ipsis litteris:
[…] “compensar horas excedentes com concessão de folgas de serviço, atende não só à legislação estatutária de regência, como também, reduz custos com o funcionamento e manutenção de serviços públicos essenciais, além de resguardar e preservar a saúde e vida social dos servidores que trabalham em regime de revezamento, diante da visível flexibilização da jornada de trabalho. Ex positis, com fundamento nos arts. 544, § 4º, II, a, do CPC, c/c 21, § 1º, do RISTF, CONHEÇO do agravo para NEGAR PROVIMENTO ao recurso extraordinário. Publique-se. Int.. Brasília, 22 de fevereiro de 2013. Ministro Luiz Fux Relator Documento assinado digitalmente (ARE 722628, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 22/02/2013, publicado em DJe-040 DIVULG 28/02/2013 PUBLIC 01/03/2013).”
O Estatuto dos Servidores Públicos Federais, Lei 8.112/90, em seu texto traz a regulamentação da jornada de trabalho mínima e máxima (art. 19), o adicional de serviço extraordinário em situações excepcionais e temporária (art. 73 e 74), banco de horas para fins de compensação de jornada (art. 44, III).
“Art. 19.Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente.”
I - a remuneração do dia em que faltar ao serviço, sem motivo justificado;
II - a parcela de remuneração diária, proporcional aos atrasos, ausências justificadas, ressalvadas as concessões de que trata o art. 97, e saídas antecipadas, salvo na hipótese de compensação de horário, até o mês subseqüente ao da ocorrência, a ser estabelecida pela chefia imediata.”
[...]
“Art. 73. O serviço extraordinário será remunerado com acréscimo de 50% (cinqüenta por cento) em relação à hora normal de trabalho.
Art.74. Somente será permitido serviço extraordinário para atender a situações excepcionais e temporárias, respeitado o limite máximo de 2 (duas) horas por jornada.”
Todavia, aos servidores públicos federais, os quais são regidos por um estatuto, uma norma especial, deve comprovar outros requisitos, além de prestação de serviços de horas extras, para o percebimento do adicional de serviço extraordinário, a prestação de serviço em situações excepcionais e temporárias, prevista do artigo 74 da Lei 8.112/91, e também, a autorização dessa jornada extraordinária pela autoridade competente.
Esses artigos foram regulamentados pelo Decreto 948/93, com previsão do limite anual de serviço extraordinário de até 44 horas mensais e de 90 horas anuais, mediante autorização do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), in verbis:
Art. 2º. A execução do serviço extraordinário será previamente autorizada, pelo dirigente de recursos humanos do órgão ou entidade interessado a quem compete identificar a situação excepcional e temporária de que trata o art. 74, da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990.
Parágrafo único. A proposta do serviço extraordinário será acompanhada da relação nominal dos servidores que o executará.
Art. 3º. A duração do serviço extraordinário não excederá a duas horas por jornada de trabalho, obedecidos os limites de quarenta e quatro horas mensais e noventa horas anuais, consecutivas ou não.
A definição dos termos “excepcionais e temporárias” em conformidade com o art. 2º da Orientação Normativa nº 02, de 06 de maio de 2008, “imperiosa necessidade, para execução de tarefas cujo adiamento ou interrupção importe em prejuízo manifesto para o serviço”, in verbis:
"Art. 2º Somente será autorizada a prestação de serviço extraordinário para atendimento de situações excepcionais e transitórias, por imperiosa necessidade, para execução de tarefas cujo adiamento ou interrupção importe em prejuízo manifesto para o serviço.” (grifo nosso)
É relevante mencionar que o STJ, ao julgar o recurso especial, manifestou o entendimento de que a jornada de trabalho realizada no recesso forense não é considerado como “excepcional ou extraordinária”, mas sim, jornada normal, in verbis:
“ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. RECURSO ESPECIAL. (…) ante a inexistência de previsão legal de pagamento de horas extraordinárias pela jornada de trabalho realizado no período de recesso forense. 4. Recurso especial conhecido e improvido. (REsp 398.203/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 03/10/2006, DJ 23/10/2006, p. 344)”.
A Turma Nacional de Uniformização (TNU) ao julgar pedido de uniformização da interpretação de lei, concluiu em sentido oposto ao entendimento do STJ, por entender que o “recesso forense como feriado”, sendo assim, a jornada desempenhada considerada como serviço “extraordinário” para fins do pagamento do adicional de serviço extraordinário, in verbis:
“PEDILEF INTERPOSTO PELA UNIÃO. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO REALIZADO NO PERÍODO DE RECESSO FORENSE. (...). A Turma Nacional de Uniformização, por maioria, decidiu conhecer do incidente de uniformização, vencidos os Juízes Federais Sérgio de Abreu Brito e Ronaldo José da Silva. No mérito, por unanimidade, negou provimento ao incidente, nos termos do voto da Juíza Relatora. Incidente de Uniformização julgado como representativo da controvérsia, nos termos do art. 17, VII, do RITNU. (PEDILEF 50113387420144047200, CARMEN ELIZANGELA DIAS MOREIRA DE RESENDE - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO.)”
Da análise dos julgados, verifica-se que para caracterizar o direito ao pagamento do adicional de serviços extraordinário, a jornada deve ser caracterizada como “excepcional ou extraordinária”. No caso em análise pelo STJ entendeu-se que o recesso forense não é considerado como "excepcional ou extraordinária", enquanto na TNU, ao considerar o “recesso forense como feriado”, a jornada desempenhada foi considerada como serviço “extraordinário”.
Portanto, entende-se que o servidor público, têm guarida no ordenamento jurídico, especialmente nos “princípios gerais de direito” primeiro, compensar a jornada de trabalho quando possuir banco de horas, por prestação de jornada além da jornada normal, sendo ilegal a exclusão das horas existentes no sistema de registro de ponto “banco de horas”, sem a correspondente compensação de jornada com folgas.
2 A INCONSTITUCIONALIDADE E ILEGALIDADE DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 76/2014/INSS
Instrução Normativa é um provimento executivo subordinado às leis e as medidas provisória. Nesse sentido foi o entendimento do Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 531, que as instruções normativas são “provimentos executivos cuja normatividade está diretamente subordinada aos atos de natureza primária, como as leis e as medidas provisórias”.
O Presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em 02.12.2014, no uso de suas atribuições regimentais conferidas pelo Decreto 7.556/2011, editou a Instrução Normativa (IN) nº 76/2014, com finalidade de uniformizar os procedimentos complementares e rotinas relativos à jornada de trabalho; o processamento da opção pela redução ou ampliação da jornada de trabalho e ao restabelecimento da jornada de quarenta horas semanais; e o controle de assiduidade e pontualidade dos servidores e dos estudantes em estágio integrantes do quadro de pessoal, in verbis:
"Art. 4º Os atrasos, as ausências justificadas, ressalvadas as concessões de que trata o art. 97 da Lei nº 8.112, de 1990, e, ainda, as saídas antecipadas, poderão ser compensados até o mês subsequente ao da ocorrência, em horário a ser estabelecido pela chefia imediata.(grifo nosso)
§ 1º Na hipótese de não compensação no prazo estipulado no caput, a unidade de Gestão de Pessoas competente providenciará, os descontos em folha, de maneira proporcional e imediata, nos termos do que dispõem o art. 44 e § 2º do art. 46, ambos da Lei nº 8.112, de 1990.(grifo nosso)
§ 2º Os servidores poderão, dentro do horário de funcionamento da unidade, realizar, no máximo, duas horas diárias além de sua jornada de trabalho, para fins da compensação a que se refere o caput, sem percepção do Adicional por Serviço Extraordinário, previsto no art. 73 da Lei nº 8.112, de 1990.(grifo nosso)
[…]
Art. 7º Os servidores submetidos ao horário especial de trabalho previsto nos arts. 5º e 6º não poderão, em qualquer hipótese, cumprir jornada superior à determinada pela junta médica oficial.(grifo nosso)
[…]
Art. 19. O Sisref efetuará o registro automático dos horários de ingresso e saída dos servidores.
§ 1º Na hipótese de saldo de débito de horas, decorrente de falta ou ausência justificada, será concedido ao servidor o direito de compensá-lo até o último dia do mês subsequente ao de sua origem, devendo a compensação ser estabelecida pela chefia imediata." (grifo nosso)
Ao analisar os fundamentos dessa norma executiva e infralegal, Instrução Normativa IN nº 77/2014, no que se refere ao banco de horas, verifica-se que, inovou o ordenamento jurídico ao vedar jornada extraordinária aos servidores, ao excluir mensalmente o “banco de horas” existente no sistema de registro de frequência, contrariando o texto da Carta Magna (§ 3º do artigo 39) ao limitar direitos garantidos a todos os trabalhadores, que também aplica-se aos servidores públicos.
O ato normativo em comento, poderia tão somente discorrer sobre horário de funcionamento da autarquia, jornada de trabalho, banco de horas, adicional serviço extraordinário, explicitando-os sem inovar o ordenamento, com novos dispositivos além das que constam na Lei e Constituição Federal. Nesse sentido, aponta-se que “regulamentar jornada”, não é o mesmo que criar novos dispositivos inexistentes, inovando o ordenamento jurídico, de acordo com a doutrina de Hely Lopes Meirelles (2016, p. 205):
“Regulamentos - Os regulamentos são atos administrativos, postos em vigência por decreto, para especificar os mandamentos da lei ou prover situações ainda não disciplinadas por lei. Desta conceituação ressaltam os caracteres marcantes do regulamento: ato administrativo (e não legislativo); ato explicativo ou supletivo da lei; ato hierarquicamente inferior à lei; ato de eficácia externa.”
Ocorre que essa norma deveria apenas regulamentar a jornada de trabalho, violando o texto constitucional e legal, limitou os direitos sociais previstos na Constituição Federal, “o banco de horas”, sem possibilitar a sua utilização meses subsequentes. Assim, conforme entendimento do INSS, caso servidor tenha créditos de horas no sistema de registro de frequência “banco de horas” no mês de exercício de trabalho, essas são excluídas automaticamente ao final de cada mês, sem qualquer pagamento pecuniário ou compensatório, contrariando as disposições previstas na Lei 8.112/90, que prevê compensação de jornada, para jornadas normais e especiais, in verbis:
“Art. 98. Será concedido horário especial ao servidor estudante, quando comprovada a incompatibilidade entre o horário escolar e o da repartição, sem prejuízo do exercício do cargo.
§ 1o Para efeito do disposto neste artigo, será exigida a compensação de horário no órgão ou entidade que tiver exercício, respeitada a duração semanal do trabalho. (Parágrafo renumerado e alterado pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
§ 2o Também será concedido horário especial ao servidor portador de deficiência, quando comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
§ 3o As disposições constantes do § 2o são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência.”
Enfim, a normatização secundária, não poderia alterar, nem criar jornada de trabalho, além das que são previstas na lei, no entanto, inovou o ordenamento jurídico ao limitar o direito às horas extras existentes no banco de horas, bem como aos servidores com jornadas especiais. No mesmo sentido manifestou sobre as instruções normativas, o Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 531, in verbis:
“As instruções normativas, editadas por órgão competente da Administração Tributária, constituem espécies jurídicas de caráter secundário, cuja validade e eficácia resultam, imediatamente, de sua estrita observância dos limites impostos pelas leis, tratados, convenções internacionais, ou decretos presidenciais, de que devem constituir normas complementares.”
De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello (2013, p. 346 - 347), que ao contrário do que ocorre nos regulamentos independentes e autônomos do Direito europeu, no Brasil não existe tal tipo de regulamento. Aqui, este tipo normativo deve ser conceituado como sendo um ato geral e (de regra) abstrato, de competência privativa do Chefe do Poder Executivo, expedido com a estrita finalidade de produzir as disposições operacionais uniformizadoras necessárias à execução da lei cuja aplicação demande atuação da Administração Pública. Conquanto, tem-se forte a afirmação de que “só a lei inova originariamente na ordem jurídica, enquanto o regulamento não a altera” (MELLO, 2013, p. 348).
Ao contrário da orientação do INSS, dada pela IN nº 77/2014, a Advocacia-Geral da União (AGU), em recurso interposto, defendeu a tese de legalidade da compensação das horas excedentes com folgas de serviço, por ser constitucional e legal, citando o entendimento em julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal, que “atende não só à legislação estatutária de regência, como também, reduz custos com o funcionamento e manutenção de serviços públicos essenciais, além de resguardar e preservar a saúde e vida social dos servidores que trabalham em regime de revezamento, diante da visível flexibilização da jornada de trabalho” (ARE 722628/MG, DJE nº 40 de 28/02/2013).
O Tribunal de Contas da União (TCU) ao julgar o pedido de consulta, no Acórdão 784/2016, manifestou possibilidade de “banco de horas”, inclusive para todos os cargos de servidores públicos federais, em aplicação por analogia, ao limite de horas prevista na CLT, in verbis:
“Jornada de trabalho. Regime de sobreaviso. Servidor público civil. Regulamentação. Limite. Consulta. Não há impedimento legal para a instituição de regime de sobreaviso para o servidor estatutário, desde que esse regime esteja disciplinado em regulamento próprio de órgão dotado de autonomia administrativa e financeira como uma das formas de cumprimento da jornada de trabalho, considerado os limites fixados pelo art. 19 da Lei 8.112/1990, bem como, para fins de registro em banco de horas, seja observada, por analogia, a proporção estabelecida no art. 244, § 2º, da CLT como limite máximo de equivalência da hora de sobreaviso em relação à hora trabalhada.” (grifo nosso)
Inclusive ao regulamentar o horário de funcionamento, jornada de trabalho e frequência de seus servidores, também regulamentou o “banco de horas”, conforme prevê a Portaria 138/2008, em seu artigo 7º, § 7º, in verbis:
“Art. 7° A flexibilização de que trata o artigo anterior será efetuada mediante a utilização de banco de horas, no qual serão registrados, de forma individualizada, os minutos trabalhados pelo servidor do Tribunal, para fins de compensação de carga horária inferior ou excedente à jornada mensal a ser cumprida.”
[...]
“§ 7º O acréscimo do limite máximo positivo a que se refere o parágrafo anterior será implementado exclusivamente quando a jornada cumprida no mês pelo servidor, respeitado o limite máximo da jornada diária, implicar – ao final do respectivo mês – saldo em banco de horas superior a vinte horas, e deve observar o procedimento disposto no parágrafo seguinte.”
Diante do explanado, registre-se que os artigos 7º e 19, § 1º, da instrução normativa (IN) 76/2014, é inconstitucional e ilegal, ao criar uma verdadeira inovação normativa e jurídica, sem o respectivo comando legal, extrapolar o poder regulamentar, violar o princípio da legalidade (arts. 5º, II, e 37, caput da CF) e a competência legislativa (art. 61 alínea c), pois devia apenas explicitar ou especificar o conteúdo preexistente na Carta Magna.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Portanto, pelos estudos realizados, demonstraram que o servidor público federal, têm guarida no ordenamento jurídico, especialmente nos “princípios gerais de direito”, de prestação de serviços em jornada extraordinária “horas extras” para fins de a compensação de jornada de trabalho, sendo totalmente ilegal e arbitrário, o ato de exclusão das horas existentes no sistema de registro de ponto, sem a sua correspondente compensação de jornada com folgas.
O direito ao pagamento do adicional de serviços extraordinário, somente é devido se as “horas extras” decorrerem de jornada caracterizada como “excepcional ou extraordinária”.
Diante de todo o exposto, percebeu-se que a Instrução Normativa nº 76/2014, é parcialmente inconstitucional, em seus artigos 7º e 19, § 1º, por expressa violação aos dispositivos previstos nos artigos 7º, incisos XIII e XVI, 39, § 3º, da Constituição Federal. O ato normativo infralegal, ao vedar a instituição do “banco de horas” para fins de compensação de jornada com folgas, com a exclusão das horas existentes no sistema de frequência sem a correspondente remuneração, extrapolou o poder regulamentar, o que não é permissivo em nosso ordenamento jurídico, pelo princípio da legalidade prevista no art. 5º, II, e art. 37, caput, da Constituição Federal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Pós-graduado no curso de Direito Constitucional da rede de ensino LFG/Anhanguera. Bacharel em direito. Advogado regularmente inscrito na OAB/GO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, THIAGO ALVES. Jornada extraordinária - cargos da carreira do seguro social Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 jan 2022, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57986/jornada-extraordinria-cargos-da-carreira-do-seguro-social. Acesso em: 29 nov 2024.
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