Em agosto de 2008 foi editada a Lei 11.767/2008 para disciplinar a inviolabilidade do advogado (dos seus atos, do seu escritório, do seu local de trabalho, das suas correspondências etc.). O texto legal aprovado foi o seguinte:
“LEI Nº 11.767, DE 7 DE AGOSTO DE 2008
Altera o art. 7º da Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994, para dispor sobre o direito à inviolabilidade do local e instrumentos de trabalho do advogado, bem como de sua correspondência.
O VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no exercício do cargo de PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º O art. 7º da Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994, passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 7º .....................................................................................
..........................................................................................................
II - a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia;
..........................................................................................................
5º ( VETADO)
6º Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada, expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes.
7º A ressalva constante do 6o deste artigo não se estende a clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou co-autores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade.
8º ( VETADO)
9º ( VETADO)
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 7 de agosto de 2008; 187o da Independência e 120º da República.
JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Tarso Genro. José Antonio Dias Toffoli”.
CF, art. 133: o advogado, consoante o disposto no art. 133 da CF, "é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei". A inviolabilidade dos atos e manifestações do advogado, como se vê, está atrelada "ao exercício da sua profissão" e aos "limites da lei".
Razões da inviolabilidade: ela existe porque o advogado, sem sombra de dúvida, cumpre o salutar (e imprescindível) papel de lutar pelos direitos e garantias, sobretudo constitucionais e internacionais, contra o arbítrio, principalmente do Estado.
Sabe-se que pelo seu significado constitucional e prático a jurisdição ocupa a posição de "garantia das garantias" (porque é ela que faz das outras uma realidade). Mas sem a intervenção do advogado essa garantia seria drasticamente reduzida (ou anulada), isto é, não passaria de uma promessa vã sem qualquer possibilidade de concretização. Se de um lado é certo que o advogado não deve nunca defender privilégios, não menos verdadeiro é que jamais deve evitar esforços para que sejam respeitados os direitos e garantias fundamentais contemplados no ordenamento jurídico vigente.
Prerrogativas não absolutas: para que o advogado cumpra seu papel a CF dotou-lhe de certas prerrogativas. Sublinhe-se, entretanto, desde logo, que não se trata de prerrogativas ou inviolabilidades absolutas. Há limites.
Imunidade penal: o primeiro conjunto normativo que assegura (e ao mesmo tempo limita) a profissão do advogado vem dado pelo próprio Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994), que proclama, na esfera criminal, a imunidade material (penal) em relação aos delitos de difamação e injúria (quanto ao desacato, como se sabe, o STF concedeu liminar para suspender a validade do texto legal).
O plenário do STF (Supremo Tribunal Federal), julgando as ADIns (ações diretas de inconstitucionalidade) 1127 e 1105, propostas pela AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) e pela PGR (Procuradoria Geral da República), que questionavam diversos dispositivos do Estatuto da Advocacia e da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), a Lei 8.906, de 4 de julho de 1994), considerou inconstitucionais alguns dispositivos importantes, destacando-se, dentre eles, a impossibilidade de o advogado ser punido por "desacato", conforme previa o parágrafo 2° do artigo 7° (Direitos do Advogado). Ou seja: com a declaração da inconstitucionalidade da expressão “ou desacato”, caiu a imunidade material do advogado em relação a esse crime.
No exercício da profissão o advogado conta também com a chamada imunidade judiciária (CP, art. 142), não respondendo criminalmente, em princípio, por difamação ou injúria. Trata-se de uma causa de exclusão da tipicidade material porque, respeitados os limites do art. 142, o risco criado (quando do uso de expressões mais ofensivas) é permitido. Não há que se falar em risco proibido (logo, não existe desaprovação da conduta).
Alcance da inviolabilidade: de outro lado, enquanto não são ultrapassados os limites do exercício da profissão, força é convir que a inviolabilidade citada na CF não alcança somente os atos e manifestações do advogado, senão também seus meios de atuação, seu local de trabalho, seu escritório, arquivos, pastas, computador, correspondências etc., ou seja, tudo isso está protegido pelo sigilo profissional (e pela inviolabilidade constitucional e legal) (nos termos do art. 7º, II, com redação dada pela Lei 11.767/2008. Também está protegido pela inviolabilidade e sigilo o local onde se localiza o departamento jurídico dentro de uma empresa. Departamento jurídico é local de trabalho do advogado, logo, faz parte da inviolabilidade prevista no § 6º supra.
Razão da inviolabilidade: a confidencialidade que existe entre o cliente e o advogado não teria sentido prático algum se não fosse protegida pelo sigilo. De qualquer modo, também esse sigilo não é absoluto.
Hipóteses de busca e apreensão: em duas situações (pelo menos) o escritório do advogado pode ser objeto de busca e apreensão: (a) quando o advogado é o investigado (nesse caso, claro, ele não está no exercício da profissão) (cf. § 6º do art. 7º do Estatuto da Advocacia); (b) quando nele se ingressa para apreender documento que constitua "elemento do corpo de delito" (CPP, art. 243, § 2º), delito esse praticado por cliente do advogado.
Quando o advogado concorre para a prática de atos ilícitos ou quando exerce sua profissão criminosamente, não há dúvida que pode ser objeto de investigação. Ele não conta com imunidade absoluta. Atos contrários ao exercício da profissão não são atos acobertados pela inviolabilidade da profissão. De qualquer modo, quando se investiga o advogado, jamais qualquer cliente pode ser prejudicado ou afetado (§ 6º citado), salvo se ele é partícipe ou co-autor do delito do advogado (§ 7º).
Regra da individualização do mandado de busca e apreensão: todo mandado de busca de apreensão, conseqüentemente, para que não seja expressão de abuso, facilmente reconduzível ao patamar da prova ilícita, não está sujeito só aos limites formais atinentes à competência para sua expedição, à atribuição para seu cumprimento etc. O mandado de busca e apreensão, ademais, está ainda adstrito a duas individualizações absolutamente necessárias: (a) a subjetiva (quem é a pessoa ou pessoas investigadas) e (b) a objetiva (qual é o fato objeto da investigação).
Mandado “genérico”: o denominado mandado de busca "genérico", que não se preocupa com tais individualizações, gera não somente ilegalidade senão também a própria ilicitude da prova (nos termos do art. 157 do CPP).
Invasão e busca e apreensão: a diferença entre "invasão" de um escritório e a verdadeira e incensurável "busca e apreensão" está na sua legalidade ou ilegalidade (ou seja: licitude ou ilicitude da obtenção da prova). Não se trata de exigir, quanto à individualização subjetiva, que do mandado conste o nome completo, qualificação integral, dados minuciosos da pessoa investigada. Não é isso. Quando impossível a descoberta de tais detalhes, deve-se identificar a pessoa pelos seus dados mínimos (nome ou pré-nome ou apelido etc.). No que se relaciona com a individualização objetiva, é mister que o fato criminoso investigado seja apontado no mandado (§ 6º).
Razão da individualização: por que toda essa preocupação, aparentemente excessiva, burocratizadora e desnecessária? É que no escritório de todo advogado existem documentos e papéis de dezenas, centenas ou milhares de clientes. Todos estão protegidos pelo sigilo. Nenhum pode ser objeto de apreensão, salvo se constituir "elemento do corpo de delito" ou se o cliente também participa do delito do advogado. E para se saber se um determinado documento é ou não "elemento do corpo de delito" (ou se se refere a um cliente participante do delito do advogado) claro que se deve antes ter ciência de qual delito se trata. Se o mandado de busca e apreensão não individualizou o fato criminoso investigado, jamais seu executor vai poder delimitar sua atuação. Diga-se a mesma coisa quando o mandado não tenha individualizado o investigado.
Se a busca se volta contra o advogado, somente documentos dele e pertinentes ao fato investigado é que podem ser apreendidos. Nenhum outro mais, porque protegido pela confidencialidade e sigilo. Se é um cliente do advogado que está sendo objeto de investigação, somente documentos dele e relacionados com o fato em apuração é que podem ser apreendidos. Se o cliente é participante do crime do advogado, documentos dele também serão apreendidos (os relacionados com o crime investigado).
Alcance dos limites: os limites legais e constitucionais, como se vê, alcançam não somente a inviolabilidade do advogado (e do seu escritório), senão também a própria atuação estatal na busca de provas para a comprovação de um fato punível. Como o executor poderá delimitar sua ação quando não sabe com precisão quem é a pessoa investigada e/ou qual é o fato investigado?
Não é preciso (e é desarrazoado exigir) que do mandado conste o nome completo, qualificação, idade, local de nascimento etc. do investigado. Isso é exagero. De outro lado, jamais se pode exigir que o mandado defina, de pronto, qual ou quais documentos serão apreendidos. Isso é absurdo! O juiz não tem condições de saber, de plano, qual ou quais documentos serão úteis e necessários para a comprovação "do corpo de delito".
A razoabilidade exige, em suma, pelo menos, duas coisas: (a) individualização da pessoa investigada assim como (b) do fato criminoso que está em apuração. A partir do cumprimento desses dois requisitos básicos torna-se possível executar fielmente o mandado de busca, sem incorrer na ilicitude da prova.
Teoria do encontro fortuito: em razão do sigilo do exercício da profissão do advogado, força é convir que no concernente aos outros documentos que se encontram em seu escritório (outros, que não os objetos da apreensão) não vale a teoria do encontro fortuito (hallazgo fortuito do direito espanhol ou Zuffalsfinden do direito alemão). É dizer: se a polícia está procurando documentos que comprovem um determinado fato criminoso, caso encontre fortuitamente documentos pertinentes a outro delito, não pode haver apreensão (porque isso não faz parte do objeto de investigação). Esse outro documento encontrado fortuitamente está protegido pelo sigilo. Não pode ser apreendido. O encontro fortuito de outros documentos não autoriza nenhuma atuação do executor do mandado.
Entre o sigilo profissional e o interesse na apuração dos crimes prepondera pela lei vigente o sigilo profissional (cf., por exemplo, o art. 207 do CPP). Mas sempre? Não. Esse sigilo cede quando o juiz autoriza por mandado a busca e apreensão de documentos relacionados com um determinado crime, assim como com uma determinada pessoa. Tudo pertinente a esse fato e pessoa investigados pode ser apreendido. Fora disso, em escritório de advogado, nada mais pode ser objeto de apreensão. Vale o sigilo.
Tudo que pode ser apreendido na casa do acusado ou do investigado pode sê-lo no escritório do advogado? Sim, desde que o investigado seja um cliente determinado e desde que o mandado explicite (além disso) qual é o fato investigado. Tudo que diz respeito a esse fato e que constitua elemento do corpo de delito (do delito investigado) pode ser apreendido. A teoria dos freios e contrapesos é mais do que oportuna para aclarar o debate que se instalou no nosso país sobre as "invasões" nos escritórios de advogados. Velha jurisprudência do STF assinala que nenhum documento que esteja em poder de advogado pode ser apreendido, salvo se constitui elemento do corpo de delito, ou seja, se se trata de documento que venha comprovar algum aspecto do fato delituoso. No mais, prepondera o sigilo.
Coisas e objetos ilícitos: fora do âmbito dos documentos, também não há dúvida que serão apreendidas coisas proibidas ou obtidas criminosamente (arma de fogo ilegal, correspondência obtida criminosamente etc.). Tudo que foge desse âmbito permitido, torna-se prova ilegal ou ilegítima (ou seja: ilícita).
Limites da investigação: os órgãos públicos encarregados da persecução penal (policiais, Ministério Público, alguns juízes etc.) normalmente reagem com energia e estridência contra a exigência de individualização subjetiva (pessoa investigada) e objetiva (fato investigado) que deve fazer parte dos mandados de busca e apreensão. Deveriam ser, na verdade, os primeiros a clamar para que tudo isso fosse rigorosamente cumprido. Alguns executores de mandados judiciais não atinam para o fato de que são pagos para cumprirem suas profissões com exatidão.
Se de um lado devem cumprir com denodo e eficiência a função de "polícia investigativa", apurando crimes e sua autoria, de outro, deveriam também se conscientizar de que não podem extrapolar (nessas diligências investigativas) os limites da legalidade. No caso PC Farias, por exemplo, dois agentes apreenderam o famoso computador onde toda a trama quadrilheira achava-se comprovada. Mas ingressaram no seu escritório sem mandado de busca de apreensão de juiz. Prova ilícita! O STF mandou excluir dos autos essa prova e nada mais sobrou para sustentar a peça acusatória contra o ex-Presidente Collor e várias outras pessoas. Derrubou-se a justa causa da ação. Reinou a impunidade!
O trabalho investigativo quando feito ao arrepio da lei e da CF conduz à impunidade. Aliás, há duas maneiras de nela se chegar: a primeira ocorre quando um delito não é devidamente apurado e a segunda quando o é de forma ilícita (ou ilegítima). A polícia (bem como o MP e outros órgãos investigativos), destarte, nem pode omitir nem pode extrapolar. Do trilho da legalidade e da constitucionalidade não pode fugir, sob pena de se posicionar como "vagão fora do trilho". Vagão fora do trilho significa arbítrio e, mais do que isso, garantia de impunidade. Sucumbe o interesse público (na apuração dos delitos e punição dos seus autores) quando o agente encarregado da prova vai além ou fica aquém do que deve e pode fazer.
Nem oito nem oitenta. Por exemplo: salvo casos excepcionalíssimos, devidamente justificados, apresenta-se como abusiva a apreensão do computador do advogado (§ 6º). Nele acham-se documentos e informações relevantes de incontáveis clientes. O exercício da profissão do advogado resulta cerceado quando ele se vê privado do seu lícito instrumento de trabalho. O que pode ser apreendido num computador? Documentos e dados pertinentes à pessoa investigada e ao fato investigado. Fora disso, é ilegalidade.
Mandado genérico ou prospectivo: se o mandado de busca e apreensão não se preocupou com tais individualizações, claro que vai gerar abuso. Por sinal, dois tipos de mandado de busca e apreensão acham-se vedados: (a) o genérico, já mencionado anteriormente (que não individualiza a pessoa investigada ou o fato investigado) e (b) o prospectivo.
Prospectivo é o mandado de busca expedido para se descobrir se uma determinada pessoa estaria cometendo algum delito. Contra ela nada existe de concreto; o mandado é expedido para se saber se ela porventura estaria cometendo algum crime. Isso está absolutamente vedado pelo direito brasileiro.
O Estado constitucional e democrático de Direito, como se nota, no campo investigativo, exige profissionais preparados, que atuem com conhecimento de causa, prudência, equilíbrio e razoabilidade. Em nome e a pretexto de que sejam respeitadas certas "razões de Estado", todo arbítrio é possível acontecer (e normalmente acontece). A morte do brasileiro e ao mesmo tempo mineiro Jean Charles no metrô de Londres veio comprovar que até mesmo em país civilizado pode se praticar barbaridades indescritíveis. E é isso que também devemos evitar no Estado constitucional de Direito. Nem arbítrio, nem barbaridades, nem erros crassos, nem impunidade. Punição sim, quando necessária, mas tudo dentro do trilho da legalidade, da constitucionalidade e da internacionalidade.
Não é fácil "combater" o crime organizado, mas a ausência de recursos técnicos ou de gente preparada ou disponível para uma determinada operação não são motivos suficientes para se autorizar o "Estado de Polícia" (ou seja: o Direito penal do inimigo). A deficiência investigativa ou operacional não pode ser compensada com o sacrifício dos direitos e garantias fundamentais. Enquanto o juiz, a polícia e o ministério público não se preocuparem com a "sintonia fina" que se exige na determinação e execução de buscas e apreensões a margem para a ilegalidade continuará muito grande. E isso conduz à impunidade. A sociedade paga seus profissionais para executarem um determinado trabalho e depois se frustram porque nada acontece em termos de punição. Paga a conta e não tem a natural contraprestação do serviço bem executado. O advogado não pode exercer sua profissão de modo abusivo, mas tampouco pode tolerar qualquer tipo de abuso praticado por órgãos públicos contra sua pessoa ou contra qualquer cliente. In medio est virtus.
Interceptação telefônica: depois do advento da Lei 11.767/2008 a vedação de interceptação telefônica contra o advogado do acusado ficou muito clara. Bem sintetizou o tema Eduardo Luiz Santos Cabette (Jus Navegandi): “... a Lei 8906/94 ( Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil ) determina em seu artigo 7º, inciso II, que é direito do advogado ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional "a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia". O § 6º do mesmo artigo supra mencionado excepciona a garantia por ordem judicial fundamentada quando "presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado". Nesse caso o juiz deverá expedir Mandado de Busca "a ser cumprido na presença de representante da OAB sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes". No entanto, tal proteção não se estende "aos clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou co – autores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade" (nova redação dada pela Lei 11.767/08)... pode-se afirmar que, além de não encontrar base na legislação ordinária por prevalecer o artigo 7º, II da Lei 8906/94, agora com a nova redação dada pela Lei 11.767/08, sobre a Lei 9296/96, as interceptações telefônicas contra advogados são inconstitucionais, não sendo possível sequer cogitar de eventual previsão a completar o vazio legal no sentido de permitir a intromissão na relação sigilosa entre clientes e causídicos ( arts. 5º, LIV e LV e 133, CF ). A única exceção previsível seria nos casos em que o advogado é o próprio autor ou co-autor dos crimes sob apuração, hipótese esta em que, na verdade, não poderia validamente ancorar-se nas prerrogativas da nobre função que aviltou, pois sequer estaria no exercício legítimo da advocacia. Frise-se, porém, a necessária ponderação com que as autoridades deverão pautar-se em casos que tais, primando pelo equilíbrio e existência de bases sólidas para deflagrar uma investigação dessa amplitude, a qual somente terá lugar em casos extremos e excepcionalíssimos”.
Vetos e mensagem: foram vetados a nova redação do parág. 5.º do art. 7.º da Lei 11.767/08, assim como os parágrafos oitavo e nono, pelas razões expressas na Mensagem n.º 594, enviada pelo Vice-Presidente José Alencar, no exercício da Presidência da República, ao Presidente do Senado Federal: “Mensagem n.º 594, de 7 de agosto de 2008. Senhor Presidente do Senado Federal, comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1.º do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por razões de interesse público, o Projeto de Lei n.º 36, de 2006 (n.º 5.245/05 na Câmara dos Deputados), que “Altera o art. 7.º da Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994, para dispor sobre o direito à inviolabilidade do local e instrumentos de trabalho do advogado, bem como de sua correspondência”. Ouvidos, o Ministério da Justiça e a Advocacia Geral da União manifestaram-se pelo veto aos seguintes dispositivos:
§§ 5.º, 8.º e 9.º do art. 7.º da Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994, alterado pelo art. 1.º do Projeto de Lei: § 5º. São instrumentos de trabalho do advogado todo e qualquer bem móvel ou intelectual utilizado no exercício da advocacia, especialmente seus computadores, telefones, arquivos impressos ou digitais, bancos de dados, livros e anotações de qualquer espécie, bem como documentos, objetos e mídias de som ou imagem, recebidos de clientes ou de terceiros”.
Razões do veto: “A definição de instrumentos de trabalho, ao compreender “documentos, objetos e mídias de som ou imagem, recebidos de clientes ou de terceiros’, pode ensejar conseqüências indesejadas: de um lado, clientes investigados poderiam, utilizando-se de artifício que extrapola os limites da relação cliente-advogado, valer-se da norma em questão para ocultar provas de práticas criminosas; de outro lado, a obtenção legítima de provas em escritórios de advocacia poderia ficar prejudicada, pois aumentaria sensivelmente a possibilidade de ataque à licitude das provas por sua potencial vinculação a ‘clientes ou terceiros’”.
“§ 8.º A quebra da inviolabilidade referida no § 6.º deste artigo, quando decretada contra advogado empregado ou membro de sociedade de advogados, será restrita ao local e aos instrumentos de trabalho privativos do advogado averiguado, não se estendendo aos locais e instrumentos de trabalho compartilhados com os demais advogados”.
Razões do veto: “A redação proposta para o § 8.º contém comando que pode inviabilizar a investigação criminal na hipótese de arquivos e documentos compartilhados em um escritório de advocacia. Ademais, a supressão do dispositivo em nada altera o resguardo do exercício profissional, uma vez que o acesso aos instrumentos de trabalho compartilhados em um escritório de advocacia não poderá extrapolar os limites do mandado judicial”.
“§ 9.º No caso de ofensa a inscrito na OAB, no exercício da profissão ou de cargo ou função de órgão dessa entidade, o conselho competente promoverá o desagravo público do ofendido, sem prejuízo da responsabilidade criminal em que incorrer o infrator”.
Razões do veto: “O veto ao § 5.º do presente projeto mantém a vigência de sua redação atual na Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994, cujo conteúdo é idêntico ao § 9.º. Assim, a fim de se evitar duplicidade de dispositivo legal, faz-se necessário o veto a este último parágrafo”.
Essas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar os dispositivos acima mencionados do projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional”.
Desagravo: ao destacar como uma das maiores vitórias da cidadania dos últimos tempos a sanção da lei 11.767 -definindo como inviolável o escritório de advocacia, em vigor a partir de hoje -, o presidente nacional da OAB, Cezar Britto, emitiu nota para esclarecer que o veto ao parágrafo 9° do projeto que originou a nova lei se deveu a mera adequação legislativa, não implicando em nenhuma alteração no instituto do desagravo do advogado. Britto explicou que o instituto tratado no parágrafo vetado - o desagravo público de advogado ou dirigente da OAB ofendido - continua intacto e com a mesma redação, previsto no parágrafo 5° da nova lei.
A seguir, a nota de esclarecimento emitida hoje pelo presidente nacional da OAB: "O instituto do desagravo ao advogado, que estava regulado no atual parágrafo 5° do artigo 7° da lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB), continuou intacto com a lei da inviolabilidade do escritório (lei 11.767) sancionada pelo presidente da República em exercício José Alencar. O projeto de lei 36/2006, ao acrescentar novos parágrafos do artigo 7°, deslocou o tema do desagravo para o parágrafo 9°. Com o veto ao parágrafo (§) 5° do projeto de lei, necessário se fez, por mera adequação legislativa, também revogar o parágrafo (§) 9° do mesmo diploma legal proposto. É que, se assim não se fizesse, o tema do desagravo estaria regulado repetidamente, isto é, no atual parágrafo 5° do artigo 7° (mantido em sua integralidade) e ainda no parágrafo 9° da nova redação; os dois têm o mesmo sentido e não poderiam conviver simultaneamente, pois seria mera redundância redacional. Os vetos no projeto de lei 36 efetivamente ocorreram nos parágrafos 5° e 8°, que não mudam a lógica defendida pela OAB, da inviolabilidade do escritório, que está centrada na redação do inciso II do artigo 7° e § 6° e 7° da lei 11.767. Com essa nova lei, o artigo 7° terá como texto integral até o 7º parágrafo, sem qualquer exclusão. Os parágrafos de 1° a 5° do texto anterior e o 6° e o 7° com nova redação".
Conclusão: a Lei 11.767/2008, de autoria do Dep. Michel Temer, era realmente necessária? A resposta foi dada por ele mesmo (O Estado de S. Paulo), nos seguintes termos: “No Brasil, não adianta dizer que a cocada é feita de coco. É preciso dizer que é feita de coco do coqueiro da Bahia”.
Deputado Federal por São Paulo (2019-2023) - é professor e jurista, Doutor em Direito pela Universidade Complutense de Madri e Mestre em Direito Penal pela USP. Exerce o cargo de Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Atuou nas funções de Delegado, Promotor de Justiça, Juiz de Direito e Advogado. Atualmente, dedica-se a ministrar palestras e aulas e a escrever livros e artigos sobre temas relevantes e atuais do cotidiano.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GOMES, Luiz Flávio. Limites da inviolabilidade do advogado - Lei 11.767/2008 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 nov 2009, 08:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/18704/limites-da-inviolabilidade-do-advogado-lei-11-767-2008. Acesso em: 28 nov 2024.
Por: RODRIGO PRESTES POLETTO
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
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